sexta-feira, 12 de julho de 2013

O NOSSO FIEL ADVOGADO


Nosso povo tem criado, graças à tradição cristã, uma proximidade sempre crescente com o Espírito Santo. Entretanto, muitos possuem uma compreensão muito sorrateira acerca desta Pessoa divina. Invocam-no, salutarmente, no principiar de um novo dia, no empreender atividades laborais ou intelectuais; tem-no como um valoroso Advogado, tendo em vista o que prometeu Jesus, antes de Sua Páscoa redentora: “Eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Paráclito, para que fique eternamente convosco” (Jo 14,16).
Paráclito, do grego “Ραράκλητος”, é devidamente traduzido para as línguas neolatinas como advogado (do latim ad vocatus: aquele que é chamado para junto) ou consolador. É por meio deste eminente auxílio que entendemos as realidades divinas nos caracteres humanos de nossa vida, jornada rumo ao céu, inclusive no tocante à Palavra de Deus, que, tal como Jesus nos garantira: “o Paráclito, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ensinar-vos-á todas as coisas e vos recordará tudo o que vos tenho dito” (Jo 14,26).
Na Profissão de Fé Católica, manifestamos: “Creio no Espírito Santo”. Este corroborar com a fidúcia da ‘Senhora Católica’ leva-nos à certeza de fé na terceira Pessoa da Santíssima Trindade, que é Deus eterno, infinito, onipotente, Criador e Senhor de todas as coisas, como o Pai e o Filho, porque de ambos procede, como de um só princípio, por via de vontade e de amor.
O Espírito Santo compõe, portanto, a Trindade e a Unidade em Deus, pois sendo resultado da relação amorosa entre o Pai e o Filho, personifica-se, sendo o amor que os une, em um mistério profundo e indecifrável. Não é um mero resultado acidental daquilo que permeia a unidade entre o Pai e o Filho, mas uma realidade querida por ambas as Pessoas divinas, procedendo voluntária e simultaneamente das duas Pessoas. Por tal motivo, a Igreja afirmar que o Espírito Santo procede por expiração, como de um só princípio entre o Pai e o Filho, por meio da vontade e do amor. Vislumbrando que a relação entre o Pai e o Filho se dá graças ao que, na Trindade, denominamos relação de paternidade e filiação, não como imaginamos com caracteres humanos, de um pai engendrar um filho no tempo, em um período de gestação, mas em Deus, este Filho é eternamente gerado pelo Pai, sem participação de um elemento feminino. É graças à Sua procedência pela expiração e amor que se denomina Espírito Santo a terceira Pessoa trinitária: “Qui ex Patre Filióque procédit” – Que procede do Pai e do Filho.
Juntamente com o Pai e o Filho, o Espírito Santo é co-eterno a ambos. Se dizemos que eternas são as três Pessoas divinas, é porque o Pai gerou o Filho desde sempre, e do Pai e do Filho procede o Espírito Santo, igualmente desde toda a eternidade. Juntamente com a eternidade, tributamos ao Espírito Santo a mesma adoração, a mesma glória que dispensamos ao Pai e ao Filho: “Qui cum Patre et Fílio simul adorátur et conglorificátur” – Que com o Pai e o Filho é igualmente adorado e conglorificado.
            A Igreja crê piamente que toda a obra de uma das Pessoas trinitárias deve ser atribuída a toda Trindade, ainda que se manifeste mais uma dessas Pessoas. Assim, por exemplo, dizemos que o Pai é Criador, que o Filho é Salvador e o Espírito Santo santifica as almas. Mas sendo ações de Deus, mesmo que se manifeste com maior realce apenas uma das Pessoas a obra é divina, sendo um só e mesmo Deus quem age. Destarte, se ao Espírito Santo adjudicamos em especial a santificação das almas, porque é obra de amor, e as obras de amor atribuem-se ao Espírito Santo, não obstante dizemos que o Pai e o Filho santificam-nos igualmente com o Divino Espírito.
            No Gênesis, lemos: “No princípio, Deus criou os céus e a terra. A terra estava informe e vazia; as trevas cobriam o abismo e o Espírito de Deus pairava sobre as águas. Deus disse: Faça-se a luz! E a luz foi feita” (Gn 1,1-3). Já nas primeiras linhas da Sagrada Escritura, entrevemos o agir trinitário: o Pai, que é Deus, cria com a Palavra que é o Verbo, o Filho, que também é Deus: “Faça-se!”. E, claramente, temos o Espírito de Deus, o Espírito Santo que pairava sobre as águas. Sinteticamente: o Pai que cria pelo Filho no Espírito Santo. E, desde a obra da criação rumando à Economia da Salvação, percebemos a manifestação paulatina e constante de Deus: na criação, como vimos, a ressalva ao Pai; perpassando pelo Antigo Testamento, o Pai se comunica aos homens com a Palavra, o Filho, falando aos patriarcas e aos profetas, sob influxo do Espírito Santo, que inspiradamente escreveram as Escrituras. Daí a Igreja, no Credo Niceno-constantinopolitano, apregoar: “Qui locútus per Prophétas” – Ele que falou pelos Profetas.
Quando da Encarnação, é o Espírito Santo quem fecunda o virginal ventre Daquela que foi escolhida para ser a Mãe de Deus: “Maria perguntou ao anjo: ‘Como se fará isso, pois não conheço homem?’ Respondeu-lhe o anjo: ‘O Espírito Santo descerá sobre ti, e a força do Altíssimo te envolverá com a sua sombra. Por isso o ente santo que nascer de ti será chamado Filho de Deus’” (Lc 1,35). É o Pai que envia o seu Filho ao mundo pelo seio imaculado de Maria, engendrado pelo Espírito Santo. Quando do ministério do Verbo Encarnado, Jesus Cristo, o Espírito repousa sobre ele, impelindo-O, fortificando-O em Sua missão, como por exemplo, dentre tantas perícopes dos Evangelhos: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu; e enviou-me para anunciar a boa nova aos pobres, para sarar os contritos de coração, para anunciar aos cativos a redenção, aos cegos a restauração da vista, para pôr em liberdade os cativos, para publicar o ano da graça do Senhor” (Lc 4,18-19). Jesus, no vértice da cruz, extenuado de dores, em agonia de morte, concede-nos o Seu Espírito, porque o Espírito Santo é Espírito do Cristo e ao tempo em que é Espírito do Pai: “Havendo Jesus tomado do vinagre, disse: ‘Tudo está consumado’. Inclinou a cabeça e rendeu o espírito” (Jo 19,30). É o Pai que nos salva pelo Filho no Espírito Santo, este mesmo Espírito que ressuscita Jesus: o Pai que ressurge o Filho pelo Espírito Santo. Jesus Ressuscitado não cessa de dar o Espírito aos seus: “Disse-lhes outra vez: ‘A paz esteja convosco! Como o Pai me enviou, assim também eu vos envio a vós.’ Depois dessas palavras, soprou sobre eles dizendo-lhes: ‘Recebei o Espírito Santo’” (Jo 20,21-22).
Com a Ascensão de Jesus, cumpre-se o que ele havia prometido (“Descerá sobre vós o Espírito Santo e vos dará força; e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia e Samaria e até os confins do mundo” – At 1,8): o Espírito Santo, com a sua descida em Pentecostes, inaugura a missão da Igreja de ser continuadora da obra da salvação operada por Cristo, Seu Esposo. O Espírito Santo desceu sobre os Apóstolos no dia de Pentecostes, isto é, cinquenta dias depois da Ressurreição de Jesus Cristo, e dez dias depois da sua Ascensão. “Chegando o dia de Pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar. De repente, veio do céu um ruído, como se soprasse um vento impetuoso, e encheu toda a casa onde estavam sentados. Apareceu-lhes então uma espécie de línguas de fogo que se repartiram e pousaram sobre cada um deles. Ficaram todos cheios do Espírito Santo e começaram a falar em línguas, conforme o Espírito Santo lhes concedia que falassem” (At 2,1-4). O Espírito é enviado à ‘Igreja-Menina’, confirmando-a na fé, enchendo-a de luzes, de forças, de caridade e da abundância de todos os seus dons. O Paráclito é enviado a toda a Igreja e, nela, a todos os fiéis. Neste sentido, em seu Catecismo, o Papa São Pio X vai dizer: “O Espírito Santo, como a alma no corpo, vivifica a Igreja com a sua graça e com os seus dons; estabelece nela o reino da verdade e do amor; e assiste-lhe a fim de que oriente os seus filhos com firmeza ao caminho do Céu” (In: Terceiro Catecismo da Doutrina Cristã, questão 141).
Pondo termo à nossa breve reflexão sobre o oitavo artigo do Credo, citamos São Basílio de Cesareia, do século IV, que trazemos como espécie de resumo catequético da ação do Espírito Santo na obra da criação e redenção, na Economia da Salvação: “Quanto à ‘economia’ estabelecida pelo homem sobre o nosso magnífico Deus e Salvador Jesus Cristo, segundo a bondade de Deus, quem refutará a plena realização da graça do Espírito? Se consideramos o passado, as bênçãos dos Patriarcas, o auxílio trazido sob o dom da Lei, os ‘tipos’, as profecias, as ações brilhantes na guerra, os milagres alcançados pelos justos, ou as disposições relativas à vinda do Senhor na carne, tudo foi realizado sob o Espírito. Ele esteve desde o início à carne do Senhor, quando dele provém a ‘unção’ e a inseparável companhia, como está escrito: ‘Sobre quem vires descer e pousar o Espírito, é o meu Filho dileto’ (Jo 1,33; Lc 3,22) e ‘Jesus de Nazaré, que Deus consagrou no Espírito Santo’ (At 10,38). Pois toda a atividade de Cristo acontece na presença do Espírito. Ele estava lá também quando foi tentado pelo diabo, como está escrito: ‘Jesus foi conduzido pelo Espírito ao deserto para ser tentado’ (Mt 4,1). Estava junto com ele, inseparavelmente, quando Jesus realizava os seus milagres, porque ‘eu expulso os demônio pela força do Espírito de Deus’ (Mt 12,28). Ele não O deixou depois da Sua Ressurreição dos mortos: quando o Senhor, para renovar o homem e para restituir-lhe – já que havia perdido – a graça recebida pelo sopro de Deus, quando o Senhor insuflou sobre as faces dos discípulos, que coisa disse? “Recebei o Espírito Santo; a quem perdoardes os pecados serão perdoados e a quem não os perdoar, ser-lhe-ão retidos (Jo 20,22-23). E a organização da Igreja? Não é evidente, e sem contradição, obra do Espírito Santo? Assim, segundo São Paulo, foi ele que deu à Igreja ‘em primeiro lugar dos apóstolos, em segundo lugar dos profetas, em terceiro lugar dos doutores; pois o dom dos milagres, pois carismas de curas, de assistência, de governo, de línguas diversas’ (1Cor 12, 28), o Espírito os distribuiu nesta ordem segundo a repartição de seus dons” (De Spirito Sancto, 16, 39).

Que as luzes do Divino Consolador, o nosso ‘Fiel Advogado’, estejam junto a nós, em auxílio de nossa fé.