sábado, 31 de março de 2012

DOMINGO DE RAMOS E DA PAIXÃO DO SENHOR


(Ano B – 01 de abril de 2012)



Bênçao de Ramos: Mc 11,1-10 ou Jo 12,12-16 (Entrada em Jerusalém)

Na Missa:
I Leitura: Is 50,4-7
Salmo Responsorial: Sl 21(22),8-9.17-18a.19-20.23-24 (R/.2a)
II Leitura: Fl 2,6-11
Evangelho: Mc 14,1-15,47 (Paixão do Senhor)



Para uma melhor reflexão dos nossos internautas acerca da Liturgia da Palavra deste Domingo da Paixão do Senhor e de Ramos, trazemos a homilia do Santo Padre Bento XVI que foi proferida em 09 de abril de 2009.


Desde já, fazemos-lhes votos de uma piedosa e frutuosa Semana Santa. Com fé em Deus, ainda esta semana, nos encontraremos por aqui.
Atenciosamente,


Seminarista Everson Fontes Fonseca




Queridos irmãos,


Acompanhado por uma multidão sempre maior de peregrinos, Jesus subira a Jerusalém para a Páscoa. Na última etapa do caminho, perto de Jericó, tinha curado o cego Bartimeu que O invocara como Filho de Davi, pedindo compaixão. Agora – já capaz de ver – com gratidão integra-se no grupo dos peregrinos. Às portas de Jerusalém quando Jesus sobe para um jumento, o animal símbolo da realeza davídica, explode espontaneamente entre os peregrinos a jubilosa certeza: Este é o Filho de Davi! Por isso saúdam Jesus com a aclamação messiânica: “Bendito o que vem em nome do Senhor”, e acrescentam: “Bendito o Reino que vem, o Reino do nosso pai Davi! Hosana nas alturas!” (Mc 11, 9s). Não sabemos com precisão o que os peregrinos entusiasmados imaginavam que fosse o Reino de Davi que vem. E compreendemos nós verdadeiramente a mensagem de Jesus, Filho de Davi? Compreendemos nós o que é o Reino de que Ele falou durante o interrogatório de Pilatos? Compreendemos o que significa que o seu Reino não é deste mundo? Ou o nosso desejo não seria porventura o contrário: que fosse deste mundo?


São João no seu Evangelho, depois da narração da entrada em Jerusalém, refere uma série de afirmações pelas quais Jesus explica o essencial deste novo gênero de Reino. Numa primeira leitura destes textos, podemos distinguir três imagens diversas do Reino, nas quais, de maneira sempre diferente, se espelha o mesmo mistério. João narra, em primeiro lugar, que entre os peregrinos que, durante a festa “queriam adorar a Deus”, havia também alguns Gregos (cf. 12, 20). Note-se o fato de que o verdadeiro objetivo destes peregrinos era adorar a Deus. Isto corresponde perfeitamente ao que Jesus disse por ocasião da purificação do Templo: “A minha casa será chamada casa de oração para todos os povos” (Mc 11, 17). O verdadeiro objetivo da peregrinação deve ser encontrar Deus; adorá-Lo e, assim, pôr na ordem justa a relação de fundo da nossa vida. Os Gregos são pessoas à procura de Deus, com a sua vida vão a caminho de Deus. Agora, por intermédio de dois Apóstolos de língua grega, Filipe e André, fazem chegar ao Senhor o pedido: “Queremos ver Jesus” (Jo 12, 21). Uma frase importante! […]


Relativamente a este pedido, que disse e fez Jesus naquela hora? O Evangelho não deixa claro se houve ou não um encontro entre aqueles Gregos e Jesus. O olhar de Jesus estende-se muito para além. Eis o núcleo da sua resposta ao pedido daquelas pessoas: “Se o grão de trigo cair na terra e não morrer, fica só ele; mas, se morrer, dá muito fruto” (Jo 12, 24). Isto significa: não tem importância um colóquio agora, mais ou menos breve, com algumas poucas pessoas, que depois regressam a casa. Como grão de trigo morto e ressuscitado, virei, de maneira totalmente nova e fora das limitações atuais, ao encontro do mundo dos Gregos. Através da ressurreição, Jesus supera os limites do espaço e do tempo. Como Ressuscitado, caminha pela vastidão do mundo e da história. Sim, como Ressuscitado, Jesus vai ter com os Gregos e fala com eles, mostra-Se a eles de tal modo que estes, que estavam longe, tornam-se vizinhos e precisamente na sua língua, na sua cultura, a sua palavra avança de modo novo e é compreendida de forma nova: vem o seu Reino. Assim podemos reconhecer duas características essenciais deste Reino. A primeira é que este Reino passa através da cruz. Uma vez que Jesus Se dá totalmente, pode, como Ressuscitado, ser de todos e tornar-Se presente em todos. Na sagrada Eucaristia, recebemos o fruto do grão de trigo morto, a multiplicação dos pães que continua em todos os tempos até ao fim do mundo. A segunda característica diz-nos que o seu Reino é universal. Cumpre-se a antiga esperança de Israel: esta realeza de Davi já não conhece fronteiras. Estende-se “de mar a mar” – como diz o profeta Zacarias (9, 10) –, isto é, abraça o mundo inteiro. Contudo, isto só é possível porque não é uma realeza feita de poder político, mas baseia-se unicamente na livre adesão do amor – um amor que, por sua vez, responde ao amor de Jesus Cristo que Se entregou por todos. Penso que devemos aprender incessantemente as duas coisas, e, primeira delas, a universalidade, a catolicidade. Esta significa que ninguém pode pôr como absoluto a sua própria pessoa, a sua cultura, o seu tempo e o seu mundo. Isto requer que todos nos acolhamos reciprocamente, renunciando a qualquer coisa de nosso. A universalidade inclui o mistério da cruz: a superação de si mesmo, a obediência à palavra comum de Jesus Cristo na Igreja comum. A universalidade é sempre uma superação de si mesmo, renúncia a algo de pessoal. A universalidade e a cruz caminham juntas. Somente assim se cria a paz.


A palavra sobre o grão de trigo morto faz parte ainda da resposta de Jesus aos Gregos, é a sua resposta. Depois, porém, Ele formula uma vez mais a lei fundamental da existência humana: “Quem tem amor à vida, perde-a, e quem detesta a sua vida neste mundo conservá-la-á para a vida eterna” (Jo 12, 25). Isto é, quem quiser conservar a sua vida para si, viver só para si próprio, agarrar tudo para si e desfrutar todas as suas possibilidades… tal pessoa perde a vida. Esta torna-se chata e vazia. Somente no abandono de si mesmo, apenas no dom desinteressado de mim em favor do outro, unicamente no “sim” à vida maior, própria de Deus, é que a nossa vida se torna vasta e grande. Assim este princípio fundamental, que o Senhor estabelece, em última análise identifica-se simplesmente com o princípio do amor. De fato, o amor significa sair de si mesmo, dar-se, não querer possuir-se a si mesmo, mas tornar-se livre de si: não dobrar-se sobre si próprio – o que será de mim? – mas olhar em frente, para o outro: para Deus e para os homens que Ele me envia. E por sua vez este princípio do amor, que define o caminho do homem, identifica-se com o mistério da cruz, o mistério de morte e ressurreição que encontramos em Cristo. Queridos amigos, talvez seja relativamente fácil aceitar isto como grande e fundamental perspectiva da vida. Mas, na realidade concreta, não se trata de reconhecer simplesmente um princípio mas de viver a sua verdade, a verdade da cruz e da ressurreição. E para isso não basta – repito-o – uma única grande decisão. É seguramente importante, essencial ousar uma vez a grande decisão fundamental, ousar o grande “sim” que o Senhor nos pede num momento determinado da nossa vida. Mas, depois, o grande “sim” do momento decisivo na nossa vida – o “sim” à verdade que o Senhor nos propõe – tem de ser diariamente consolidado nas situações de todos os dias nas quais, sempre de novo, devemos abandonar o nosso eu, colocarmo-nos à disposição, quando no fundo quereríamos pelo contrário poupar o nosso eu. A uma vida reta pertence também o sacrifício, a renúncia. Quem promete uma vida sem este dom incessante de si mesmo, engana as pessoas. Não existe uma vida bem sucedida, sem sacrifício. Se lanço um olhar retrospectivo à minha vida pessoal, devo dizer que os momentos em que disse “sim” a uma renúncia foram precisamente os momentos grandes e importantes da minha vida.


Enfim São João, na sua redação das palavras do Senhor no “Domingo de Ramos”, acolheu também uma forma modificada da oração de Jesus no Horto das Oliveiras. Temos, em primeiro lugar, a afirmação: “A minha alma está perturbada” (12, 27). Transparece aqui o pavor de Jesus, ilustrado amplamente pelos outros três evangelistas: o seu pavor diante do poder da morte, diante de todo o abismo do mal que Ele vê e ao qual deve descer. O Senhor sofre as nossas angústias juntamente conosco, acompanha-nos através da angústia derradeira até à luz. Depois, em João, aparecem duas perguntas de Jesus. A primeira é expressa apenas condicionalmente: “E que hei de dizer? Pai, salva-me desta hora?” (12, 27). Como ser humano, também Jesus Se sente impelido a pedir que Lhe seja poupado o terror da paixão. Também nós podemos rezar deste modo. Podemos também lamentar-nos na presença do Senhor, como Jó, apresentar-Lhe todas as interrogações que surgem em nós à vista da injustiça no mundo e da dificuldade do nosso próprio eu. Diante d’Ele não devemos refugiar-nos em frases piedosas, num mundo fictício. Rezar significa sempre também lutar com Deus e, como Jacó, podemos dizer-Lhe: “Não te deixarei partir enquanto não me abençoares” (Gn 32, 27). Mas depois vem o segundo pedido de Jesus: “Glorifica o teu nome!” (Jo 12, 28). Nos sinópticos, este pedido ressoa assim: “Não se faça, contudo, a minha vontade, mas a tua” (Lc 22, 42). No fim, a glória de Deus, o seu domínio, a sua vontade é sempre mais importante e mais verdadeira do que o meu pensamento e a minha vontade. E, na nossa oração e na nossa vida, o essencial é isto: aprender esta ordem justa da realidade, aceitá-la intimamente; confiar em Deus e crer que Ele está a fazer o que é justo; que a sua vontade é a verdade e o amor; que a minha vida se torna boa, se aprendo a aderir a esta ordem. Vida, morte e ressurreição de Jesus são, para nós, a garantia de que podemos verdadeiramente fiar-nos de Deus. É assim que se realiza o seu Reino.

sábado, 24 de março de 2012

V DOMINGO DA QUARESMA


(Ano A – 25 de março de 2012)



I Leitura: Jr 31,31-34
Salmo Responsorial: Sl 50 (51),3-4.12-13.14-15 (R/.12a)
II Leitura: Hb 5,7-9
Evangelho: Jo 12,20-33 (Morte e glorificação)



Queridos irmãos,



Eis que estamos nos aproximando das festas pascais. Por isso, mergulhados no Evangelho de São João, contemplamos os passos firmes e resolutos do Senhor, rumo à sua Paixão, Morte e Ressurreição. São os dias de nossa redenção, recordados todos os anos pelo calendário litúrgico. A cada dia, a Liturgia, pedagogicamente, nos insere nestes mistérios pascais, tonalizando o nosso coração e vida à Ars Celebranda Ecclesiae Christi (ao ofício de celebrar da Igreja de Cristo).


No Evangelho de hoje, temos a narração de um fato que aconteceu já na última fase da vida pública de Jesus, próxima à sua paixão, morte e ressurreição, ou seja, a sua Páscoa. Estando Nosso Senhor em Jerusalém para a maior festa dos judeus, a páscoa judaica, para cuja acorrência se dirigiam os judeus espalhados por todo o mundo, inclusive os gregos (ou prosélitos como eram denominados também) que, atraídos pelas maravilhas que tinham presenciado em Jerusalém, quando da entrada triunfal de Jesus à saudação de hosanas, querem ter um encontro mais pessoal com o Mestre. Neste intento, disseram a Filipe: “Senhor, queremos ver Jesus!” (Jo 12, 21). Percebemos aqui uma sede no coração desses adventícios em querer conhecer o Senhor. Esta necessidade é também algo inerente ao coração de todos os homens, pois a fé lhe é conatural.


A uma primeira vista, meramente sorrateira, parece que o Senhor não dá muita importância ao pedido daqueles gregos que desejavam vê-lo. No entanto, essa opinião muda quando mergulhamos no versículo 32: “E eu, quando for elevado da terra, atrairei todos a mim”. Se aqueles homens queriam ver Jesus, o Senhor afirma que a visão mais relevante se dará quando, na sua hora, entregar-se pela salvação da humanidade no patíbulo da cruz. Se aqueles homens desejam contemplar realmente Jesus, esta se dará na glorificação da cruz, como profetizara Isaías, o “meu Servo prosperará, crescerá, elevar-se-á, será exaltado. Assim como, à sua vista, muitos ficaram embaraçados - tão desfigurado estava que havia perdido a aparência humana -, assim o admirarão muitos povos: os reis permanecerão mudos diante dele, porque verão o que nunca lhes tinha sido contado, e observarão um prodígio inaudito” (Is 52,13-15). É, pois, sob a sombra do escândalo gritante e silencioso da cruz, numa cena repelente e triunfante do Cristo crucificado, extenuado de dores, disforme, que o encontramos glorificado. É nesta mesma cruz, onde repousa o santo e imaculado corpo de Nosso Senhor, que acontece a reunião da humanidade redimida, atraída para um só rebanho, sem distinção. Somente sob o Cristo Pascal é que exclamaremos: “Quanto a mim, não pretendo, jamais, gloriar-me, a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo” (Gl 6,14). 


“Senhor, nosso Deus, dai-nos por vossa graça caminhar com alegria na mesma caridade que levou o vosso Filho a entregar-se à morte no seu amor pelo mundo”. Assim rezamos na Oração de Coleta desta liturgia dominical. A cruz do Senhor é a máxima expressão do seu amor perfeitíssimo porque além de, por meio dela, remir-nos, congrega-nos no seu amor e no amor aos irmãos. Neste sentido, o Papa Bento XVI, meditando acerca do versículo 32 do Evangelho de hoje, afirma: “A cruz: a altura do amor é a altura de Jesus e a esta altura Ele atrai a todos”, e completaríamos, indistintamente.


Outro trecho do Evangelho chama nossa atenção: “Se o grão de trigo que cai na terra não morre, ele continua só um grão de trigo; mas, se morre, então produz muito fruto. Quem se apega à sua vida, perde-a; mas quem faz pouca conta de sua vida neste mundo, conservá-la-á para a vida eterna” (v. 24-25). No primeiro momento, uma linguagem parabólica que utiliza uma imagem simplória, mas repleta de significado; na segunda parte, explicita claramente o que deveras afirmaria de maneira figurativa. Jesus é o grão que livremente, decompõe-se, explodindo de amor, se doa, para gerar vida abundante, tal como o trigo que, no bojo da terra, apodrece, explode em germe, e deste faz brotar uma planta de espigas douradas formadas por abundantes granículos.  Diante do aparente paradoxo dotado de plena realidade, temos o ideal cristão do seguimento: o perder para ganhar. Nesta lógica, Santo Agostinho, comentando tal passagem, fomenta a nossa imitação ao Cristo, desprendido de sua vida por amor: “Grande e maravilhosa verdade, no homem isto é um amor por sua alma que a perde, e um ódio que a salva. Se a tens amado exageradamente, a tens odiado; se tens odiado os excessos, então a tens amado. Felizes aqueles que odiaram as suas almas salvando-a, e não a perderam por haver-lhe amado demasiadamente” (Comment. in Ioan., 51, 10).  


Paixão e Morte de Cristo: glorificação de Deus; derrota do maligno; vitória e soerguimento da humanidade outrora ferida mortalmente pelo pecado (cf. Jo 12,28.31). Sangue de Cristo: selo da Nova e Eterna Aliança entre Deus e o Seu Novo Povo, verdadeira casa de Israel e Judá. Não mais como no tempo de Jeremias, em que o reino, cujos súditos estavam exilados e escravizados, estava dividido em duas casas (Judá e Israel), sendo, portanto, distantes e rivais, mas sim como um único povo do Senhor, isto é a Igreja, Una e Imaculada. Se no Antigo Testamento as alianças do Senhor para com o povo, realidades prefigurativas da Nova e Eterna, eram representadas em aspectos insuficientes e variados, a Vera Aliança habita corporalmente em uma pessoa, Jesus Cristo crucificado, escandalosamente morto, como sinal de redenção para a humanidade decaída e atolada em seus crimes e misérias. Portanto, é no absurdo e ignomínia da cruz que reconheceremos, inconfundivelmente, o Senhor. E, ao vê-lo desta forma, recordaremos a Aliança (cf. Jr 31,34). O Crucificado é a identidade do cristão e o motivo de sua pregação: “mas nós pregamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os pagãos; mas, para os eleitos - quer judeus quer gregos -, força de Deus e sabedoria de Deus” (1Cor 1,23-24).


Na Segunda Leitura, como é típica da Carta aos Hebreus, é-nos apresentado Jesus como Sumo Sacerdote da Nova e Eterna Aliança. Diz-nos a perícope: “Cristo, nos dias de sua vida terrestre, dirigiu preces e súplicas com forte clamor e lágrimas, àquele que era capaz de salvá-lo” (5,7). Esta atitude é típica de quem é sacerdote, elevando orações a Deus. Porém, não se trata de uma exterior oração, como que desvinculada da vida. Muito pelo contrário, vida e oração de Jesus se confundem, por este motivo é atendido pelo Pai. Ilustra-nos tal afirmativa a passagem: “E foi atendido, por causa de sua entrega a Deus” (v. 7). Esta atitude de entrega do Senhor é averiguada no brado final da cruz: “Pai, em tuas mãos eu entrego o meu espírito” (Lc 23,46). Mas o que pedia filialmente Jesus ao Pai senão a nossa salvação? Cristo se fez obediente ao Pai para os que lhe são obedientes. Em Jesus obediência e sofrimento se misturam harmoniosamente; em nós, a obediência é sinônima de imitação daquele que, “sendo exteriormente reconhecido como homem, humilhou-se ainda mais, tornando-se obediente até a morte, e morte de cruz” (Fl 2,8), o que não nos isenta dos sofrimentos e cruzes da vida.


Que este restante do Santo Tempo da Quaresma nos auxilie imensamente para a nossa preparação interior na celebração das festas pascais que se aproximam; dias máximos em que revivemos, litúrgica e misticamente com a Igreja, a bendita e sagrada Paixão de Nosso Senhor, que quis padecer e morrer na cruz por nosso amor, para nossa redenção. 

sábado, 17 de março de 2012

IV DOMINGO DA QUARESMA


(ANO B – 18 DE MARÇO DE 2011)



I Leitura: 2Cr 36, 14-16.19-23
Salmo Responsorial: Sl 136 (137),1-2.3.4-5.6 (R/.6a)
II Leitura: Ef 2,4-10
Evangelho: 3, 14-21 (Jesus vida e luz)



Queridos irmãos,



A Liturgia deste domingo, logo na Antífona de Entrada, faz-nos uma proposta: “Laetáre, Jerúsalem: et convéntum fácite, omnes qui dilígitis eam: gaudéte cum laetítia, qui in tristítia fuístis: ut exsultétis, et satiémini ab ubéribus consolatiónis vestrae – Alegra-te, Jerusalém! Reuni-vos, vós todos que a amais; vós que estais tristes, exultai de alegria! Saciai-vos com a abundância de suas consolações” (Is 66, 10-11). Por este motivo, existe uma tradição litúrgica de denominar este IV Domingo da Quaresma de Laetáre (“Alegra-te!”), ou seja, porque o Senhor nos vai consolar, nos vai salvar. Alguns sacerdotes, seguindo esta antiqüíssima tradição, em lugar da cor roxa, utilizam os paramentos de cor rósea, justamente para, na amenização do roxo, manifestar a alegria que a salvação traz à humanidade.


Inspira-nos igualmente este júbilo comedido a Oração de Coleta: “Ó Deus, que por vosso Filho realizais de modo admirável a reconciliação do gênero humano, concedei ao povo cristão correr ao encontro das festas que se aproximam, cheio de fervor e exultando de fé”.


Sem fugir desta temática, a Liturgia da Palavra de hoje, já na Primeira Leitura e a partir dela no restante, apresenta-nos um dado importantíssimo: em toda a História da Salvação (desde a criação da humanidade até a Páscoa de Jesus, o Redentor Filho de Deus), e tudo o que dela segue e pertence, a misericórdia de Deus é uma constante. Com a perícope do Segundo Livro de Crônicas, a Magistra Ecclésia (Mestra Igreja) quer nos mostrar, pela releitura teológico-histórica que o Livro Sagrado nos apresenta, como, apesar da infidelidade do povo, Deus é fiel e misericordioso. Assim, o texto refletido mostra que, tanto os chefes dos sacerdotes quanto o povo, sem exceção de ninguém, pecaram gravemente tal como se não conhecem a vontade do Senhor, chegando ao máximo pecado da profanação do “Templo que o Senhor tinha santificado em Jerusalém” (cf. 2Cr 36, 14).


Com uma atitude paciente, porém ativa – típica da iniciativa de Deus, o que não constitui paradoxo –, Deus sempre lhes ia ao encontro através de mensageiros, ou seja, os profetas e os sinais que cada tempo lhes oferecia. Mas, por que o Senhor fazia isso? O autor do texto claramente alude: “Porque tinha compaixão do seu povo e da sua própria casa” (v. 15). Constatamos, então, que Deus está sempre próximo aos seus, não está logrado distante de Israel; Israel é a casa do Senhor; Ele habita aí. Em meio aos amores de um Deus extremamente apaixonado pelo seu povo, correspondiam-no com contrariedades já que “eles zombavam dos enviados de Deus, desprezavam as suas palavras – e continua o hagiógrafo – até que o furor do Senhor se levantou contra o seu povo e não houve mais remédio” (v. 18). Quem são estes mensageiros de Deus rejeitados pelo povo? Os profetas até Jesus, Plenitude da Revelação Divina.


A invasão de Israel pelos babilônios não era sinonímia da impotência do Senhor. Não! Muito pelo contrário! Diante da miséria e tragédias implantadas no seu país, na sua amada Jerusalém e no seu já profanado Templo, presenciando tanta cena de destruição, morte de muitos entes queridos e de cativeiro, o povo de Israel é chamado a uma pedagogia: Deus nos ama; somos-lhe ingratos; por causa do nosso pecado nos veio o castigo, a desolação merecida. No entanto, não é somente esta a certeza que Israel deve tirar; Deus quer dar um feliz complemento a esta situação histórica, mas, acima de tudo, teológica: o povo arrepende-se, converte-se e o Senhor lhes salva.


É por Ciro que a libertação vem? Não! Ciro será apenas um instrumento escolhido por Deus dentro de um contexto político-histórico que é enxertado de um pano de fundo teológico, inclusive, tal certeza é colocada na boca e punho de Ciro, um pagão, como proclamação da liberdade de Israel: “Assim fala Ciro, rei da Pérsia: O Senhor encarregou-me de lhe construir um templo em Jerusalém, que está no país de Judá. Quem dentre vós todos pertence ao seu povo? Que o Senhor, seu Deus, esteja com ele, e que se ponha a caminho” (v. 23). Na figuração do Antigo Testamento, a destruição do Templo significava dizer a destruição de todo Israel; a sua reconstrução, a vivificação do país. Assim sendo, a profanação do Templo simbolizava que o povo está imerso no pecado, já que o Templo é tido como centro do mundo judaico-israelita. 


Para nós fica o invitatório de sempre reconhecermo-nos, diante de nossas inúmeras infidelidades e misérias, pecadores. Ao tempo em que somos chamados a reconhecer o dedo amoroso de Deus na nossa história, até mesmo onde parecer absurdo. Quantas vezes estamos afastados do Templo, Deus, e somente quando encontramos-nos no exílio do vazio trazido pelo pecado lembramo-nos do Senhor, da distância que nos impusemos em relação a Ele? A tristeza do salmista por estar longe do Templo, de sua amada terra, deve ser o nosso brado quando estivermos longe Daquele que é o sentido do nosso existir, da Alegria do nosso coração.


No Evangelho, vemos um trecho do diálogo de Jesus com Nicodemos, justamente na parte em que o próprio Senhor prediz a sua paixão e morte que, neste texto é simbolizada pela serpente de bronze (Jo 3, 14; Nm 21, 8-9). É por ele que o homem adquire a vida, nasce para uma vida imortal, incorruptível, ou seja, a Vida Eterna. Esta doação de vida por parte de Deus Pai, no Filho pelo Espírito Santo é a máxima expressão de seu amor e da fidelidade de sua misericórdia e Aliança inextinguível. Para termos acesso à Graça da Salvação oferecida a todo o gênero humano faz-se mister que creiamos naquele que, “aniquilou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo e assemelhando-se aos homens” (Fl 2,7). Quem crê em Jesus é da luz e todo o seu ser igualmente torna-se transparência dessa luz que o mesmo Cristo, inclusive nas ações cotidianas que, tantas e tantas vezes, nos aparentam ser banais e não-influentes no processo de fé no Senhor, mas que são capazes de levar à luz de cuja magnificência desejamos: a convivência com o próprio Deus. Quem crê em Jesus é luz na terra e alcança a Luz do Céu, o próprio Senhor, a contemplação de sua face.


É pela morte de Cristo pendurado na Cruz, tal como a serpente na haste o prefigurava, que alcançamos a Vida vera, a Luz Beatífica. Neste sentido, Santo Agostinho nos diz: “Existe uma diferença entre a figura e a realidade: é que aqueles eram curados somente da morte temporal, voltando a uma vida material, mas estes obtêm a vida eterna” (In Ioannem tract., 12).


Vejamos a Segunda Leitura. São Paulo, escrevendo aos efésios, faz questão de afirmar a riqueza da misericórdia, fruto do seu imenso amor manifestado, de uma forma especialíssima, na plenitude dos tempos, quando envia o seu Cristo, ou seja, “quando estávamos mortos por causa das nossas faltas, ele nos deu a vida” (Ef 2, 5). Mas o que fizemos de nobre, de magnânimo, para recebermos a salvação, alvitre da benevolente misericórdia de Deus? Absolutamente nada! Para frisar tal elemento, por duas vezes São Paulo nos lembra: na primeira, “é por graça que vós sois salvos” (v. 5); e na segunda, “é pela graça que vós sois salvos, mediante a fé. E isso não vem de vós; é dom de Deus! Não vem das obras, para que ninguém se orgulhe. Pois é ele quem nos fez; nós fomos criados em Jesus Cristo para as boas obras, que Deus preparou de antemão para que nós as praticássemos” (v. 8-10). Logo, tudo, inclusive a nossa salvação, é gratuidade divina; as nossas boas obras são obrigações morais que devem, ao menos, manifestar a nossa fé, pois, como nos lembra São Tiago: “Assim como o corpo sem a alma é morto, assim também a fé sem obras é morta” (Tg 2,26).  Acompanha-nos nesta linha de reflexão a Oração Pós-Comunhão desta nossa Liturgia: “Ó Deus, luz de todo ser humano que vem a este mundo, iluminai nossos corações com o esplendor da vossa graça, para pensarmos sempre o que vos agrada e amar-vos de todo o coração".


Que nestes dias da Santa Quaresma, preparação eminente e iminente para a Páscoa do Senhor, maior festa da cristandade, possamos nutrir em nós a certeza da salvação e o anseio de, quanto mais breve, tornarmo-nos, em sentido pleno, filhos da luz, inseridos na visão da Glória dos Eleitos, nossa páscoa eterna, para, juntos e com o Ressuscitado, reinarmos para sempre. Amém.   

segunda-feira, 12 de março de 2012

ANUÁRIO PONTIFÍCIO 2012: CATÓLICOS CRESCEM NA ÁSIA


No total, 17,5% da população do planeta é católica


CIDADE DO VATICANO, segunda-feira, 12 de março de 2012  - O número de católicos batizados continua crescendo globalmente, embora com significativas diferenças entre Europa-América e Ásia-África.


As estatísticas constam no Anuário Pontifício 2012, apresentado ao papa Bento XVI na manhã deste sábado (10) pelo cardeal Tarcisio Bertone, Secretário de Estado, e por dom Angelo Becciu, substituto na Secretaria de Estado para os Assuntos Gerais.


O novo anuário esteve a cargo de dom Vittorio Formenti, do Departamento Central de Estatísticas da Igreja, em conjunto com o prof. Enrico Nenna e outros colaboradores. Foi apresentado também o Annuarium Statisticum Ecclesiae, editado pelo mesmo departamento.


O complexo trabalho de impressão de ambos os volumes foi liderado por Sergio Pellini, SDB, Antonio Maggiotto, SDB, e Giuseppe Canesso, SDB, respectivamente Diretor Geral, Diretor Comercial e Diretor Técnico da Tipografia Vaticana. O livro estará disponível em breve nas livrarias.


De acordo com a assessoria de imprensa do Vaticano, o papa agradeceu pela cortesia, mostrou grande interesse pelos dados apresentados e pediu que a sua sincera gratidão fosse manifestada a todos que colaboraram na nova edição.


O livro revela que em 2011 foram erigidas pelo Santo Padre 8 novas sedes episcopais, 1 ordinariato pessoal e 1 ordinariato militar; foram elevadas 1 arquidiocese e 8 dioceses a sedes metropolitanas, bem como 1 prelazia, 1 vicariato apostólico e 1 prefeitura apostólica a dioceses, além de 1 missão sui iuris a prefeitura apostólica.


Os dados estatísticos se referem a 2010 e fornecem uma análise sintética das principais dinâmicas da Igreja católica nas 2.966 circunscrições eclesiásticas do planeta.


Os católicos em 2010 somavam 1,196 bilhão, em comparação com cerca de 1,181 bilhão em 2009, com um aumento absoluto de 15 milhões de fiéis. Ao longo dos últimos dois anos, a presença dos católicos batizados em todo o mundo permanece estável em cerca de 17,5% da população global.


A participação territorial dos católicos sofreu variações não desprezíveis entre 2009 e 2010: perderam importância na América do Sul (de 28,54% para 28,34%) e especialmente na Europa (de 24,05% para 23,83%). Porém, ganharam posição na África (de 15,15% para 15,55%) e no Sudeste da Ásia (de 10,41% para 10,87%).


De 2009 a 2010, o número de bispos no mundo aumentou de 5.065 para 5.104, com aumento relativo de 0,77%. O aumento aconteceu na África (16 novos bispos), América (15) e Ásia (12), enquanto uma ligeira diminuição ocorreu na Europa (de 1.607 para 1.606) e na Oceania (de 132 para 129).


A tendência de crescimento no número de sacerdotes, que começou em 2000, continuou em 2010, ano em que foram contados 412.236 padres, dos quais 277.009 diocesanos e 135.227 do clero regular; em 2009 eram 410.593, sendo 275.542 diocesanos e 135.051 religiosos.


No todo, o clero aumentou entre 2009 e 2010 em 1.643 padres. Os aumentos foram registrados na Ásia (1.695), África (761), Oceania (52) e América (40), enquanto a queda afetou a Europa (905 sacerdotes a menos).


O número de diáconos permanentes, tanto diocesanos quanto religiosos, continua com tendência de crescimento elevado. Em 2010, aumentou 3,7% em relação a 2009, passando de 38.155 para 39.564. Os diáconos permanentes estão presentes principalmente na América do Norte e na Europa (64,3% e 33,2%, respectivamente).


A tendência de declínio que afeta há alguns anos os religiosos professos que não são sacerdotes parece ter encontrado um freio em 2010. Eram 54.229 em 2009 e passaram a 54.665 em 2010. Diminuíram nas Américas do Sul (-3,5%) e do Norte (-0,9%), ficaram estáveis na Europa e aumentaram na Ásia (+4,1%) e na África (+3,1%).


As religiosas professas também passam por uma profunda transformação, caracterizada por uma dinâmica fortemente decrescente. Globalmente, elas diminuíram de 729.371 em 2009 para 721.935 em 2010. A queda se concentrou em três continentes (Europa, América e Oceania), com significativas variações negativas (-2,9% na Europa, -2,6% na Oceania e -1,6% na América). Já na África e na Ásia o aumento foi considerável, em torno de 2% para ambos os continentes.


O número de estudantes de filosofia e teologia nos seminários diocesanos e religiosos tem aumentado continuamente nos últimos cinco anos. Ao todo, aumentou 4%, de 114.439 em 2005 para 118.990 em 2010. O número de seminaristas maiores diminui na Europa (-10,4%) e na América (-1,1%) e cresce na África (+14,2%), na Ásia (+13%) e na Oceania (+12,3%).

Fonte: www.zenit.org

sexta-feira, 9 de março de 2012

III DOMINGO DA QUARESMA


(Ano B – 11 de março de 2012)



I Leitura: Ex 20, 1-17
Salmo Responsorial: Sl 18 (19b), 8.9.10.11 (R/. Jo 6, 68c)
II Leitura: 1Cor 1, 22-25
Evangelho: Jo 2, 13-25 (Mercadores do Templo)


Queridos irmãos

Trazemos hoje para os nossos estimados leitores uma belíssima reflexão acerca da Liturgia da Palavra deste III Domingo da Quaresma. Esta reflexão foi proferida em 19 de março de 2006. São palavras breves, mas de profundidade imensa: típicas do Santo Padre.

Caro amigo, fazemos votos de que esta caminhada quaresmal prepare-nos devidamente para as Celebrações Litúrgicas da Páscoa do Senhor. Que a oração, a esmola e a penitência nos sejam úteis para a nossa purificação, a fim de sermos menos indignos de aproximar-nos do mistério de Sua Paixão, Morte e Ressurreição.

Um Santo Domingo!

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Amados irmãos e irmãs,


Juntos ouvimos uma famosa e bonita página do Livro do Êxodo, em que o autor sagrado narra a entrega a Israel do Decálogo por parte de Deus. Um pormenor chama imediatamente a nossa atenção: a enunciação dos dez mandamentos é introduzida por uma significativa referência à libertação do povo de Israel. O texto diz: "Eu sou o Senhor teu Deus, que te fiz sair da terra do Egito, da casa da servidão" (Êx 20, 2). Por conseguinte, o Decálogo deseja ser uma confirmação da liberdade conquistada. Com efeito, se considerarmos profundamente, os mandamentos são o instrumento que o Senhor nos concede para defender a nossa liberdade, tanto dos interiores condicionamentos das paixões, como dos abusos exteriores dos mal-intencionados. Os "não" dos mandamentos são outros tantos "sim" ao crescimento de uma liberdade autêntica. Há uma segunda dimensão do Decálogo, que deve ser também ressaltada: mediante a Lei dada através de Moisés, o Senhor revela que deseja estabelecer um pacto de aliança com Israel. Portanto, mais do que uma imposição, a Lei é uma dádiva. Mais do que determinar o que o homem deve fazer, ela quer manifestar a todos a opção de Deus: Ele está da parte do povo eleito; libertou-o da escravidão e circunda-o com a sua bondade misericordiosa. O Decálogo é testemunho de um amor de predileção.


A Liturgia de hoje oferece-nos uma segunda mensagem: a Lei mosaica encontrou o seu pleno cumprimento em Jesus, que revelou a sabedoria e o amor de Deus mediante o mistério da Cruz, "escândalo para os judeus e loucura para os gentios – como nos disse São Paulo na segunda leitura – mas para os que são chamados, tanto judeus como gregos... é poder e sabedoria de Deus" (1 Cor1, 23-24). É precisamente a este mistério que faz referência a página evangélica que acaba de ser proclamada: Jesus expulsa do templo os vendilhões e os cambistas. O Evangelista oferece a chave de leitura deste episódio significativo, através do versículo de um Salmo: "O zelo da tua casa me consome" (Sl 69 [68], 10). E Jesus é "consumido" por este "zelo" pela "casa de Deus", utilizada para finalidades diferentes daquelas para as quais seria destinada. Diante do pedido dos responsáveis religiosos, que pretendem um sinal da sua autoridade, no meio da admiração dos presentes, Ele afirma: "Destruí este templo, e em três dias Eu o levantarei!" (Jo 2, 19). Palavras misteriosas, incompreensíveis naquele momento, mas que João volta a formular para os seus leitores cristãos, observando: "Ele, porém, falava do templo que é o seu corpo" (Jo 2, 21). Os seus adversários teriam destruído aquele "templo", mas depois de três dias Ele tê-lo-ia reconstruído mediante a ressurreição. A dolorosa e "escandalosa" morte de Cristo seria coroada pelo triunfo da sua gloriosa ressurreição. Enquanto neste período quaresmal nos preparamos para reviver no Tríduo pascal este acontecimento central da nossa salvação, já fixamos o nosso olhar no Crucificado, vislumbrando nele o esplendor do Ressuscitado.