(Ano B – 01 de
abril de 2012)
Bênçao de
Ramos: Mc 11,1-10 ou Jo 12,12-16 (Entrada em Jerusalém)
Na Missa:
I Leitura: Is
50,4-7
Salmo
Responsorial: Sl 21(22),8-9.17-18a.19-20.23-24 (R/.2a)
II Leitura: Fl
2,6-11
Evangelho: Mc
14,1-15,47 (Paixão do Senhor)
Para uma melhor reflexão dos
nossos internautas acerca da Liturgia da Palavra deste Domingo da Paixão do
Senhor e de Ramos, trazemos a homilia do Santo Padre Bento XVI que foi
proferida em 09 de abril de 2009.
Desde já, fazemos-lhes votos de
uma piedosa e frutuosa Semana Santa. Com fé em Deus, ainda esta semana, nos
encontraremos por aqui.
Atenciosamente,
Seminarista Everson Fontes
Fonseca
Queridos irmãos,
Acompanhado por uma multidão
sempre maior de peregrinos, Jesus subira a Jerusalém para a Páscoa. Na última
etapa do caminho, perto de Jericó, tinha curado o cego Bartimeu que O invocara
como Filho de Davi, pedindo compaixão. Agora – já capaz de ver – com gratidão
integra-se no grupo dos peregrinos. Às portas de Jerusalém quando Jesus sobe
para um jumento, o animal símbolo da realeza davídica, explode espontaneamente
entre os peregrinos a jubilosa certeza: Este é o Filho de Davi! Por isso saúdam
Jesus com a aclamação messiânica: “Bendito o que vem em nome do Senhor”, e
acrescentam: “Bendito o Reino que vem, o Reino do nosso pai Davi! Hosana nas
alturas!” (Mc 11, 9s). Não
sabemos com precisão o que os peregrinos entusiasmados imaginavam que fosse o
Reino de Davi que vem. E compreendemos nós verdadeiramente a mensagem de Jesus,
Filho de Davi? Compreendemos nós o que é o Reino de que Ele falou durante o
interrogatório de Pilatos? Compreendemos o que significa que o seu Reino não é
deste mundo? Ou o nosso desejo não seria porventura o contrário: que fosse
deste mundo?
São João no seu Evangelho, depois
da narração da entrada em Jerusalém, refere uma série de afirmações pelas quais
Jesus explica o essencial deste novo gênero de Reino. Numa primeira leitura
destes textos, podemos distinguir três imagens diversas do Reino, nas quais, de
maneira sempre diferente, se espelha o mesmo mistério. João narra, em primeiro
lugar, que entre os peregrinos que, durante a festa “queriam adorar a Deus”,
havia também alguns Gregos (cf. 12, 20). Note-se o fato de que o verdadeiro
objetivo destes peregrinos era adorar a Deus. Isto corresponde perfeitamente ao
que Jesus disse por ocasião da purificação do Templo: “A minha casa será
chamada casa de oração para todos os povos” (Mc 11, 17). O verdadeiro objetivo da
peregrinação deve ser encontrar Deus; adorá-Lo e, assim, pôr na ordem justa a
relação de fundo da nossa vida. Os Gregos são pessoas à procura de Deus, com a
sua vida vão a caminho de Deus. Agora, por intermédio de dois Apóstolos de
língua grega, Filipe e André, fazem chegar ao Senhor o pedido: “Queremos ver
Jesus” (Jo 12, 21). Uma
frase importante! […]
Relativamente a este pedido, que
disse e fez Jesus naquela hora? O Evangelho não deixa claro se houve ou não um
encontro entre aqueles Gregos e Jesus. O olhar de Jesus estende-se muito para
além. Eis o núcleo da sua resposta ao pedido daquelas pessoas: “Se o grão de
trigo cair na terra e não morrer, fica só ele; mas, se morrer, dá muito fruto”
(Jo 12, 24). Isto
significa: não tem importância um colóquio agora, mais ou menos breve, com
algumas poucas pessoas, que depois regressam a casa. Como grão de trigo morto e
ressuscitado, virei, de maneira totalmente nova e fora das limitações atuais,
ao encontro do mundo dos Gregos. Através da ressurreição, Jesus supera os
limites do espaço e do tempo. Como Ressuscitado, caminha pela vastidão do mundo
e da história. Sim, como Ressuscitado, Jesus vai ter com os Gregos e fala com
eles, mostra-Se a eles de tal modo que estes, que estavam longe, tornam-se
vizinhos e precisamente na sua língua, na sua cultura, a sua palavra avança de
modo novo e é compreendida de forma nova: vem o seu Reino. Assim podemos
reconhecer duas características essenciais deste Reino. A primeira é que este
Reino passa através da cruz. Uma vez que Jesus Se dá totalmente, pode, como
Ressuscitado, ser de todos e tornar-Se presente em todos. Na sagrada
Eucaristia, recebemos o fruto do grão de trigo morto, a multiplicação dos pães
que continua em todos os tempos até ao fim do mundo. A segunda característica
diz-nos que o seu Reino é universal. Cumpre-se a antiga esperança de Israel:
esta realeza de Davi já não conhece fronteiras. Estende-se “de mar a mar” –
como diz o profeta Zacarias (9, 10) –, isto é, abraça o mundo inteiro. Contudo,
isto só é possível porque não é uma realeza feita de poder político, mas
baseia-se unicamente na livre adesão do amor – um amor que, por sua vez,
responde ao amor de Jesus Cristo que Se entregou por todos. Penso que devemos
aprender incessantemente as duas coisas, e, primeira delas, a universalidade, a
catolicidade. Esta significa que ninguém pode pôr como absoluto a sua própria
pessoa, a sua cultura, o seu tempo e o seu mundo. Isto requer que todos nos
acolhamos reciprocamente, renunciando a qualquer coisa de nosso. A
universalidade inclui o mistério da cruz: a superação de si mesmo, a obediência
à palavra comum de Jesus Cristo na Igreja comum. A universalidade é sempre uma
superação de si mesmo, renúncia a algo de pessoal. A universalidade e a cruz caminham
juntas. Somente assim se cria a paz.
A palavra sobre o grão de trigo
morto faz parte ainda da resposta de Jesus aos Gregos, é a sua resposta.
Depois, porém, Ele formula uma vez mais a lei fundamental da existência humana:
“Quem tem amor à vida, perde-a, e quem detesta a sua vida neste mundo
conservá-la-á para a vida eterna” (Jo 12,
25). Isto é, quem quiser conservar a sua vida para si, viver só para si
próprio, agarrar tudo para si e desfrutar todas as suas possibilidades… tal
pessoa perde a vida. Esta torna-se chata e vazia. Somente no abandono de si
mesmo, apenas no dom desinteressado de mim em favor do outro, unicamente no
“sim” à vida maior, própria de Deus, é que a nossa vida se torna vasta e
grande. Assim este princípio fundamental, que o Senhor estabelece, em última
análise identifica-se simplesmente com o princípio do amor. De fato, o amor
significa sair de si mesmo, dar-se, não querer possuir-se a si mesmo, mas
tornar-se livre de si: não dobrar-se sobre si próprio – o que será de mim? – mas
olhar em frente, para o outro: para Deus e para os homens que Ele me envia. E
por sua vez este princípio do amor, que define o caminho do homem,
identifica-se com o mistério da cruz, o mistério de morte e ressurreição que
encontramos em Cristo. Queridos amigos, talvez seja relativamente fácil aceitar
isto como grande e fundamental perspectiva da vida. Mas, na realidade concreta,
não se trata de reconhecer simplesmente um princípio mas de viver a sua
verdade, a verdade da cruz e da ressurreição. E para isso não basta – repito-o
– uma única grande decisão. É seguramente importante, essencial ousar uma vez a
grande decisão fundamental, ousar o grande “sim” que o Senhor nos pede num
momento determinado da nossa vida. Mas, depois, o grande “sim” do momento decisivo
na nossa vida – o “sim” à verdade que o Senhor nos propõe – tem de ser
diariamente consolidado nas situações de todos os dias nas quais, sempre de
novo, devemos abandonar o nosso eu, colocarmo-nos à disposição, quando no fundo
quereríamos pelo contrário poupar o nosso eu. A uma vida reta pertence também o
sacrifício, a renúncia. Quem promete uma vida sem este dom incessante de si
mesmo, engana as pessoas. Não existe uma vida bem sucedida, sem sacrifício. Se
lanço um olhar retrospectivo à minha vida pessoal, devo dizer que os momentos
em que disse “sim” a uma renúncia foram precisamente os momentos grandes e
importantes da minha vida.
Enfim São João, na sua redação
das palavras do Senhor no “Domingo de Ramos”, acolheu também uma forma
modificada da oração de Jesus no Horto das Oliveiras. Temos, em primeiro lugar,
a afirmação: “A minha alma está perturbada” (12, 27). Transparece aqui o pavor
de Jesus, ilustrado amplamente pelos outros três evangelistas: o seu pavor
diante do poder da morte, diante de todo o abismo do mal que Ele vê e ao qual
deve descer. O Senhor sofre as nossas angústias juntamente conosco,
acompanha-nos através da angústia derradeira até à luz. Depois, em João,
aparecem duas perguntas de Jesus. A primeira é expressa apenas condicionalmente:
“E que hei de dizer? Pai, salva-me desta hora?” (12, 27). Como ser humano,
também Jesus Se sente impelido a pedir que Lhe seja poupado o terror da paixão.
Também nós podemos rezar deste modo. Podemos também lamentar-nos na presença do
Senhor, como Jó, apresentar-Lhe todas as interrogações que surgem em nós à
vista da injustiça no mundo e da dificuldade do nosso próprio eu. Diante d’Ele
não devemos refugiar-nos em frases piedosas, num mundo fictício. Rezar
significa sempre também lutar com Deus e, como Jacó, podemos dizer-Lhe: “Não te
deixarei partir enquanto não me abençoares” (Gn 32, 27). Mas depois vem o segundo
pedido de Jesus: “Glorifica o teu nome!” (Jo 12, 28). Nos sinópticos, este pedido
ressoa assim: “Não se faça, contudo, a minha vontade, mas a tua” (Lc 22, 42). No fim, a glória de Deus, o
seu domínio, a sua vontade é sempre mais importante e mais verdadeira do que o
meu pensamento e a minha vontade. E, na nossa oração e na nossa vida, o
essencial é isto: aprender esta ordem justa da realidade, aceitá-la
intimamente; confiar em Deus e crer que Ele está a fazer o que é justo; que a
sua vontade é a verdade e o amor; que a minha vida se torna boa, se aprendo a
aderir a esta ordem. Vida, morte e ressurreição de Jesus são, para nós, a
garantia de que podemos verdadeiramente fiar-nos de Deus. É assim que se
realiza o seu Reino.
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