sábado, 31 de março de 2012

DOMINGO DE RAMOS E DA PAIXÃO DO SENHOR


(Ano B – 01 de abril de 2012)



Bênçao de Ramos: Mc 11,1-10 ou Jo 12,12-16 (Entrada em Jerusalém)

Na Missa:
I Leitura: Is 50,4-7
Salmo Responsorial: Sl 21(22),8-9.17-18a.19-20.23-24 (R/.2a)
II Leitura: Fl 2,6-11
Evangelho: Mc 14,1-15,47 (Paixão do Senhor)



Para uma melhor reflexão dos nossos internautas acerca da Liturgia da Palavra deste Domingo da Paixão do Senhor e de Ramos, trazemos a homilia do Santo Padre Bento XVI que foi proferida em 09 de abril de 2009.


Desde já, fazemos-lhes votos de uma piedosa e frutuosa Semana Santa. Com fé em Deus, ainda esta semana, nos encontraremos por aqui.
Atenciosamente,


Seminarista Everson Fontes Fonseca




Queridos irmãos,


Acompanhado por uma multidão sempre maior de peregrinos, Jesus subira a Jerusalém para a Páscoa. Na última etapa do caminho, perto de Jericó, tinha curado o cego Bartimeu que O invocara como Filho de Davi, pedindo compaixão. Agora – já capaz de ver – com gratidão integra-se no grupo dos peregrinos. Às portas de Jerusalém quando Jesus sobe para um jumento, o animal símbolo da realeza davídica, explode espontaneamente entre os peregrinos a jubilosa certeza: Este é o Filho de Davi! Por isso saúdam Jesus com a aclamação messiânica: “Bendito o que vem em nome do Senhor”, e acrescentam: “Bendito o Reino que vem, o Reino do nosso pai Davi! Hosana nas alturas!” (Mc 11, 9s). Não sabemos com precisão o que os peregrinos entusiasmados imaginavam que fosse o Reino de Davi que vem. E compreendemos nós verdadeiramente a mensagem de Jesus, Filho de Davi? Compreendemos nós o que é o Reino de que Ele falou durante o interrogatório de Pilatos? Compreendemos o que significa que o seu Reino não é deste mundo? Ou o nosso desejo não seria porventura o contrário: que fosse deste mundo?


São João no seu Evangelho, depois da narração da entrada em Jerusalém, refere uma série de afirmações pelas quais Jesus explica o essencial deste novo gênero de Reino. Numa primeira leitura destes textos, podemos distinguir três imagens diversas do Reino, nas quais, de maneira sempre diferente, se espelha o mesmo mistério. João narra, em primeiro lugar, que entre os peregrinos que, durante a festa “queriam adorar a Deus”, havia também alguns Gregos (cf. 12, 20). Note-se o fato de que o verdadeiro objetivo destes peregrinos era adorar a Deus. Isto corresponde perfeitamente ao que Jesus disse por ocasião da purificação do Templo: “A minha casa será chamada casa de oração para todos os povos” (Mc 11, 17). O verdadeiro objetivo da peregrinação deve ser encontrar Deus; adorá-Lo e, assim, pôr na ordem justa a relação de fundo da nossa vida. Os Gregos são pessoas à procura de Deus, com a sua vida vão a caminho de Deus. Agora, por intermédio de dois Apóstolos de língua grega, Filipe e André, fazem chegar ao Senhor o pedido: “Queremos ver Jesus” (Jo 12, 21). Uma frase importante! […]


Relativamente a este pedido, que disse e fez Jesus naquela hora? O Evangelho não deixa claro se houve ou não um encontro entre aqueles Gregos e Jesus. O olhar de Jesus estende-se muito para além. Eis o núcleo da sua resposta ao pedido daquelas pessoas: “Se o grão de trigo cair na terra e não morrer, fica só ele; mas, se morrer, dá muito fruto” (Jo 12, 24). Isto significa: não tem importância um colóquio agora, mais ou menos breve, com algumas poucas pessoas, que depois regressam a casa. Como grão de trigo morto e ressuscitado, virei, de maneira totalmente nova e fora das limitações atuais, ao encontro do mundo dos Gregos. Através da ressurreição, Jesus supera os limites do espaço e do tempo. Como Ressuscitado, caminha pela vastidão do mundo e da história. Sim, como Ressuscitado, Jesus vai ter com os Gregos e fala com eles, mostra-Se a eles de tal modo que estes, que estavam longe, tornam-se vizinhos e precisamente na sua língua, na sua cultura, a sua palavra avança de modo novo e é compreendida de forma nova: vem o seu Reino. Assim podemos reconhecer duas características essenciais deste Reino. A primeira é que este Reino passa através da cruz. Uma vez que Jesus Se dá totalmente, pode, como Ressuscitado, ser de todos e tornar-Se presente em todos. Na sagrada Eucaristia, recebemos o fruto do grão de trigo morto, a multiplicação dos pães que continua em todos os tempos até ao fim do mundo. A segunda característica diz-nos que o seu Reino é universal. Cumpre-se a antiga esperança de Israel: esta realeza de Davi já não conhece fronteiras. Estende-se “de mar a mar” – como diz o profeta Zacarias (9, 10) –, isto é, abraça o mundo inteiro. Contudo, isto só é possível porque não é uma realeza feita de poder político, mas baseia-se unicamente na livre adesão do amor – um amor que, por sua vez, responde ao amor de Jesus Cristo que Se entregou por todos. Penso que devemos aprender incessantemente as duas coisas, e, primeira delas, a universalidade, a catolicidade. Esta significa que ninguém pode pôr como absoluto a sua própria pessoa, a sua cultura, o seu tempo e o seu mundo. Isto requer que todos nos acolhamos reciprocamente, renunciando a qualquer coisa de nosso. A universalidade inclui o mistério da cruz: a superação de si mesmo, a obediência à palavra comum de Jesus Cristo na Igreja comum. A universalidade é sempre uma superação de si mesmo, renúncia a algo de pessoal. A universalidade e a cruz caminham juntas. Somente assim se cria a paz.


A palavra sobre o grão de trigo morto faz parte ainda da resposta de Jesus aos Gregos, é a sua resposta. Depois, porém, Ele formula uma vez mais a lei fundamental da existência humana: “Quem tem amor à vida, perde-a, e quem detesta a sua vida neste mundo conservá-la-á para a vida eterna” (Jo 12, 25). Isto é, quem quiser conservar a sua vida para si, viver só para si próprio, agarrar tudo para si e desfrutar todas as suas possibilidades… tal pessoa perde a vida. Esta torna-se chata e vazia. Somente no abandono de si mesmo, apenas no dom desinteressado de mim em favor do outro, unicamente no “sim” à vida maior, própria de Deus, é que a nossa vida se torna vasta e grande. Assim este princípio fundamental, que o Senhor estabelece, em última análise identifica-se simplesmente com o princípio do amor. De fato, o amor significa sair de si mesmo, dar-se, não querer possuir-se a si mesmo, mas tornar-se livre de si: não dobrar-se sobre si próprio – o que será de mim? – mas olhar em frente, para o outro: para Deus e para os homens que Ele me envia. E por sua vez este princípio do amor, que define o caminho do homem, identifica-se com o mistério da cruz, o mistério de morte e ressurreição que encontramos em Cristo. Queridos amigos, talvez seja relativamente fácil aceitar isto como grande e fundamental perspectiva da vida. Mas, na realidade concreta, não se trata de reconhecer simplesmente um princípio mas de viver a sua verdade, a verdade da cruz e da ressurreição. E para isso não basta – repito-o – uma única grande decisão. É seguramente importante, essencial ousar uma vez a grande decisão fundamental, ousar o grande “sim” que o Senhor nos pede num momento determinado da nossa vida. Mas, depois, o grande “sim” do momento decisivo na nossa vida – o “sim” à verdade que o Senhor nos propõe – tem de ser diariamente consolidado nas situações de todos os dias nas quais, sempre de novo, devemos abandonar o nosso eu, colocarmo-nos à disposição, quando no fundo quereríamos pelo contrário poupar o nosso eu. A uma vida reta pertence também o sacrifício, a renúncia. Quem promete uma vida sem este dom incessante de si mesmo, engana as pessoas. Não existe uma vida bem sucedida, sem sacrifício. Se lanço um olhar retrospectivo à minha vida pessoal, devo dizer que os momentos em que disse “sim” a uma renúncia foram precisamente os momentos grandes e importantes da minha vida.


Enfim São João, na sua redação das palavras do Senhor no “Domingo de Ramos”, acolheu também uma forma modificada da oração de Jesus no Horto das Oliveiras. Temos, em primeiro lugar, a afirmação: “A minha alma está perturbada” (12, 27). Transparece aqui o pavor de Jesus, ilustrado amplamente pelos outros três evangelistas: o seu pavor diante do poder da morte, diante de todo o abismo do mal que Ele vê e ao qual deve descer. O Senhor sofre as nossas angústias juntamente conosco, acompanha-nos através da angústia derradeira até à luz. Depois, em João, aparecem duas perguntas de Jesus. A primeira é expressa apenas condicionalmente: “E que hei de dizer? Pai, salva-me desta hora?” (12, 27). Como ser humano, também Jesus Se sente impelido a pedir que Lhe seja poupado o terror da paixão. Também nós podemos rezar deste modo. Podemos também lamentar-nos na presença do Senhor, como Jó, apresentar-Lhe todas as interrogações que surgem em nós à vista da injustiça no mundo e da dificuldade do nosso próprio eu. Diante d’Ele não devemos refugiar-nos em frases piedosas, num mundo fictício. Rezar significa sempre também lutar com Deus e, como Jacó, podemos dizer-Lhe: “Não te deixarei partir enquanto não me abençoares” (Gn 32, 27). Mas depois vem o segundo pedido de Jesus: “Glorifica o teu nome!” (Jo 12, 28). Nos sinópticos, este pedido ressoa assim: “Não se faça, contudo, a minha vontade, mas a tua” (Lc 22, 42). No fim, a glória de Deus, o seu domínio, a sua vontade é sempre mais importante e mais verdadeira do que o meu pensamento e a minha vontade. E, na nossa oração e na nossa vida, o essencial é isto: aprender esta ordem justa da realidade, aceitá-la intimamente; confiar em Deus e crer que Ele está a fazer o que é justo; que a sua vontade é a verdade e o amor; que a minha vida se torna boa, se aprendo a aderir a esta ordem. Vida, morte e ressurreição de Jesus são, para nós, a garantia de que podemos verdadeiramente fiar-nos de Deus. É assim que se realiza o seu Reino.

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