(Ano B – 26 de fevereiro de 2012)
I Leitura: Gn 9,8-15
Salmo Responsorial: Sl 24(25),4bc-5ab.6-7bc.8-9 (R/. cf. 10)
II Leitura: 1Pd 3,18-22
Evangelho: Mc 1,12-15 (Tentação de Jesus)
Queridos irmãos,
Desde a quinta-feira que nós, seminaristas da Arquidiocese de
Aracaju, estamos em retiro espiritual, que se estenderá até o próximo sábado.
Estão sendo dias de muita graça. A nossa temática é: “A formação dos Apóstolos
de Jesus nos Evangelhos Sinóticos”. Nosso pregador é o Monsenhor Antônio Luiz
Catelan, da Diocese de Umuarama, Estado do Paraná.
Portanto, para a reflexão deste I Domingo da Quaresma, postamos um
texto do Frei Raniero Cantalamessa intitulado: “Com Cristo não temos nada a
temer”.
Um santo Domingo a todos e até a próxima!
Seminarista Everson Fontes
O demônio, o satanismo e outros fenômenos
relacionados são de grande atualidade e inquietam frequentemente a nossa
sociedade. Nosso mundo tecnológico e industrializado está repleto de magos,
bruxos urbanos, ocultismo, espiritismo, escrutinadores de horóscopos,
vendedores de feitiços, de amuletos, assim como de autênticas seitas satânicas.
Expulso pela porta, o diabo entrou pela janela. Ou seja, expulso pela fé,
voltou a entrar com a superstição.
O episódio das tentações de Jesus no deserto,
que se lê no primeiro domingo da Quaresma, ajuda-nos a oferecer um pouco de
clareza a este tema. Antes de tudo, existe demônio? Isto é, a palavra “demônio”
indica de verdade alguma realidade pessoal, dotada de inteligência e vontade,
ou é simplesmente um símbolo, um modo de falar que indica a soma do mal moral
do mundo, o inconsciente coletivo, a alienação coletiva e coisas pelo estilo?
Muitos, entre os intelectuais, não creem no demônio segundo o primeiro sentido.
Mas se deve observar que grandes escritores e pensadores, como Goethe ou
Dostoievski, levaram muito a sério a existência de satanás. Baudelaire, que não
era certamente trigo limpo, disse que “a maior astúcia do demônio é fazer crer
ele que não existe”.
A principal prova da existência do demônio nos
evangelhos não está nos numerosos episódios de libertação de possessos, porque
na interpretação destes fatos pode haver influência de crenças antigas sobre a
origem de certas doenças. Jesus tentado no deserto pelo demônio: esta é a
prova. Provas são também os muitos santos que lutaram em vida contar o príncipe
das trevas. Não são Quixotes que brigam contra moinhos de vento. Ao contrário:
foram homens e mulheres concretos e de psicologia saudável.
Se muitos acham absurdo crer no demônio, é
porque se baseiam em livros, passam a vida em bibliotecas ou no escritório,
enquanto o demônio não se interessa por literatura, mas pelas pessoas,
especialmente os santos. O que pode saber sobre satanás quem jamais teve nada a
ver com sua realidade, mas só com sua ideia, isto é, com as tradições
culturais, religiosas, etnológicas sobre satanás? Esses tratam habitualmente
deste tema com grande segurança e superioridade, liquidando tudo como “obscurantismo
medieval”. Mas trata-se de uma falsa segurança. Como se alguém deixasse de
temer o leão aduzindo como prova o fato de que viu muitas vezes sua imagem e
jamais lhe deu medo. Por outro lado, é totalmente normal e coerente que não
creia no diabo quem não crê em Deus. Seria até trágico se alguém que não crê em
Deus acreditasse no diabo!
O mais importante que a fé cristã tem a
dizer-nos não é, no entanto, que o demônio existe, mas que Cristo venceu o
demônio. Cristo e o demônio não são para os cristãos dois princípios iguais e
contrários, como em certas religiões dualistas. Jesus é o único Senhor; satanás
não é senão uma criatura que “se perdeu”. Se lhe concede poder sobre os homens,
é para que estes tenham a possibilidade de fazer livremente uma escolha e
também para que “não se ensoberbeçam” (2Cor 12, 7), crendo-se auto-suficientes
e sem necessidade de redentor algum. “Que loucura a do velho satanás – diz um
canto espiritual negro. Atirou para destruir minha alma, mas errou o tiro e
destruiu por outro lado o meu pecado”.
Com Cristo não temos nada a temer. Nada nem
ninguém pode fazer-nos dano se nós não quisermos. Satanás – dizia um antigo
padre da Igreja –, após a vinda de Cristo, é como um cão atado na árvore; pode
latir e balançar quanto quiser; se não nos aproximamos, não pode morder. Jesus
no deserto se libertou de satanás para libertar-nos de satanás! É a gozosa
notícia com a qual iniciamos nosso caminho quaresmal para a Páscoa.
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