sexta-feira, 15 de junho de 2012

MARIA E O MAGNIFICAT

Queridos leitores,


Estes dias, estamos com muitas atividades em nosso seminário. O tempo está muito reduzido: é o final do semestre. Por isso, para não perder o contato com vocês, ainda sob a influência do mês de Maria, publico a seguinte postagem.

Agradeço a atenção de vocês!

Seminarista Everson Fontes Fonseca

__________________________________________________




A Virgem Maria era profundamente conhecedora da Palavra de Deus. Não somente porque o Verbo, na plenitude dos tempos, se fez carne em seu ventre benditíssimo quando da anunciação de Gabriel e da sua concepção como obra do Espírito Santo; antes mesmo do evento da embaixada do Anjo e consequente encarnação de Deus, Maria já refletia em seu coração as Escrituras ensinadas em seu lar pelo seu venerável pai, São Joaquim, já que às mulheres não era permitida a inserção na sinagoga, e lhes eram privados os acessos diretos às Leis e a Profecias, bem como ao lugar reservado do Templo. Assim, somente os homens tinham tais benesses e tinham por religiosa obrigação a transmissão da Palavra e dos Mandamentos de Deus à sua casa, fazendo jus à ordem dada por Moisés: “Tu os inculcarás a teus filhos, e deles falarás, seja sentado em tua casa, seja andando pelo caminho, ao te deitares e ao te levantares” (Dt 6,7). Neste sentido, porque Maria, já desde a tenra idade, ter sempre meditado a Palavra de Deus, Santo Agostinho afirma: Maria fez plenamente a vontade do Pai e por isso é mais para Maria ter sido discípula de Cristo do que Mãe de Cristo (Sermões, 5, 7). A observância de Maria às Escrituras e aos sinais de Deus não para aí, pois toda a sua vida será regrada pela constante aludida por São Lucas: “Maria conservava todas estas palavras, meditando-as no seu coração” (Lc 2,19). Com estas linhas, queremos, através do Magnificat, o Cântico de Maria, ponderar a solicitude da Virgem para com a Palavra de Deus, transparecendo-a com a sua vida em estreita com o que ela cria e rezava.


Ao visitar a sua prima Isabel, grávida de João, o precursor, Maria, a “Plena de Graça”, prenhe no coração e no ventre do Verbo, prorrompe em um louvor eminente, quiçá o maior dentre as criaturas já apresentado pela Bíblia. Poderíamos considerar o Magnificat como um compêndio de toda a esperança teológica de Israel. O Cântico de Maria reflete a missão do Messias diante da expectativa dos povos, inclusive dos judeus. Inspirada pelo Espírito Santo, de quem é cheia e de quem gera virginalmente, Maria percorre intencionalmente a toda Lei e as Profecias (inclusive o saltério), sintetizado-as em seu bradar. E com propriedade, já que fisicamente porta em seu interior a Palavra de Deus, por meio da qual tudo foi feito (cf. Jo 1,3). Em linhas gerais, poderíamos afirmar que o Cântico de Maria é a litania brotada de tantos, marcados pela pequenez e pelo espírito de expectativa pela vinda do Messias, em especial dos pobres (anawin). Assim, Maria profetiza que Deus, ao fazer homem, assume o partido dos pequenos, e realiza uma transformação histórica, invertendo a ordem social: os ricos e poderosos são depostos e despojados; os pobres e oprimidos são libertos e assumem a direção dessa nova história. Logo, este hino canta a gratidão pessoal da Mãe de Jesus, depois a de todo o povo de Deus, pelo cumprimento das promessas da Aliança.
Estruturalmente, os exegetas veem no Magnificat uma semelhança com o Cântico de Ana (cf. 1Sm 2,11-10), porém com uma originalidade peculiar, pois ela não para aí, mas testifica profecias e o saltério, tal como anteriormente aludíamos.


Estabelecemos a seguir uma ponte entre o Magnificat e as passagens inspiradoras, de cujas referências, a Virgem parece ter recorrido:


“E Maria disse: Minha alma glorifica ao Senhor, meu espírito exulta de alegria em Deus, meu Salvador” (Lc 1,46-47); “Ana pronunciou esta prece: Exulta o meu coração no Senhor, nele se eleva a minha força; a minha boca desafia os meus adversários, porque me alegro na vossa salvação” (1Sm 2,1); “Então a minha alma exultará no Senhor, e se alegrará pelo seu auxílio” (Sl 34,9).


“Porque olhou para sua pobre serva. Por isto, desde agora, me proclamarão bem-aventurada todas as gerações” (Lc 1,48); “E fez um voto, dizendo: Senhor dos exércitos, se vos dignardes olhar para a aflição de vossa serva, e vos lembrardes de mim; se não vos esquecerdes de vossa escrava e lhe derdes um filho varão, eu o consagrarei ao Senhor durante todos os dias de sua vida, e a navalha não passará pela sua cabeça” (1Sm 1,11); “Sim, excelso é o Senhor, mas olha os pequeninos, enquanto seu olhar perscruta os soberbos” (Sl 137,6).


“Porque realizou em mim maravilhas aquele que é poderoso e cujo nome é Santo” (Lc 1,49); “Enviou a seu povo a redenção, concluiu com ele uma aliança eterna. Santo e venerável é o seu nome” (Sl 110,9); “Sim, o Senhor fez por nós grandes coisas; ficamos exultantes de alegria!” (Sl 125,3).


“Sua misericórdia se estende, de geração em geração, sobre os que o temem” (Lc 1,50); “Faço aliança contigo e com tua posteridade, uma aliança eterna, de geração em geração, para que eu seja o teu Deus e o Deus de tua posteridade” (Gn 17,7); “Mas uso de misericórdia até a milésima geração com aqueles que me amam e guardam os meus mandamentos” (Ex 20,6).


“Manifestou o poder do seu braço: desconcertou os corações dos soberbos” (Lc 1,51); “O Senhor descobre seu braço santo aos olhares das nações, e todos os confins da terra verão o triunfo de nosso Deus” (Is 52,10).


“Derrubou do trono os poderosos e exaltou os humildes” (Lc 1,52); “Quebra-se o arco dos fortes, enquanto os fracos se revestem de vigor […]Levanta do pó o mendigo, do esterco retira o indigente, para fazê-los sentar-se entre os nobres e outorgar-lhes um trono de honra, porque do Senhor são as colunas da terra. Sobre elas estabeleceu o mundo” (1Sm 2,4.8); “Exalta os humildes, e dá nova alegria aos que estão de luto” (Jó 5,11).


“Saciou de bens os indigentes e despediu de mãos vazias os ricos” (Lc 1,53); “Os abastados se assalariam para ganharem o que comer, enquanto os famintos são saciados. Sete vezes dá à luz a estéril, enquanto a mãe de numerosos filhos enlanguesce. O Senhor dá a morte e a vida, faz descer à habitação dos mortos e de lá voltar” (1Sm 2,5-6).


“Acolheu a Israel, seu servo, lembrado da sua misericórdia” (Lc 1,54); “Naquele tempo - oráculo do Senhor - serei o Deus de todas as tribos de Israel, e elas constituirão o meu povo […] De longe me aparecia o Senhor: amo-te com eterno amor, e por isso a ti estendi o meu favor” (Jr 31,1.3); “Lembrou-se de sua bondade e de sua fidelidade em favor da casa de Israel. Os confins da terra puderam ver a salvação de nosso Deus” (Sl 97,3).


“Conforme prometera a nossos pais, em favor de Abraão e sua posteridade, para sempre” (Lc 1,55); “O Senhor fez a Davi um juramento, de que não há de se retratar: Colocarei em teu trono um descendente de tua raça” (Sl 131,11).


Ao contemplarmos este brado profético de louvor emanado dos lábios e do interior da Virgem Santa, Mulher atenta à Palavra do Senhor, somos invitados, a partir do seu exemplo, a um olhar de esperança, na certeza de que a providência de Deus age, inclusive quando estamos no charco de nossa miséria, muito embora Maria Santíssima fosse imaculada e, “ab aeterno”, fosse grande aos olhos do Criador que a cumulou de tantas graças em previsão dos méritos de Cristo. Que a intercessão materna da Senhora de Nazaré sempre nos auxilie. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário