sexta-feira, 14 de novembro de 2014

XXXIII DOMINGO DO TEMPO COMUM

(Ano A – 16 de novembro de 2014)


I Leitura: Pr 31,10-13.19-20.30-31
Salmo Responsorial: Sl 127(128),1-2.3.4-5ab (R/. cf. 1a)
II Leitura: 1Ts 5,1-6
Evangelho: Mt 25,14-30



“Deus contemplou toda a sua obra, e viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31). É com esta certeza que o autor do Livro dos Gênesis conclui o primeiro relato da criação. Tudo, inclusive os homens, Deus cria, e assim o faz tendo em vista a Sua bondade, enquanto Criador, e a utilidade de toda criatura para a glória divina e para o bem da criação. Logo, como criaturas de Deus, fomos pensados com um talento primário: a bondade, e, por este caráter, refletimos o próprio Criador. Entretanto, alguns não fazem caso deste ‘proto-talento’ – fazer o bem, ser do bem – e obstinam-se no mal. Mas, o que é talento?
Talento era uma unidade de medida relativa ao ouro. Um talento equivalia a um montante de quase trinta e cinco quilo de ouro. Logo, não é uma moeda, mas uma fortuna considerável. O Evangelho diz-nos que o homem da parábola, ao viajar para o estrangeiro, “chamou os seus empregados e lhes entregou seus bens”, o que supomos que, muito rico, entregou nos oito talentos de ouro, toda a sua fortuna. Deus, em sua benevolência, oferece os bens da criação ao homem para que, na sua administração, seja capaz de fazer frutifica-los em multíplices outras benesses.
Percebam que a fortuna foi distribuída desigualmente, e o Evangelho deixa claro o porquê: [deu] “a cada um de acordo com a sua capacidade” (Mt 25,15). No original grego, encontramos o termo dynamis (dynamin), o que em latim se traduz por virtus (virtutem), ou seja, de acordo com as forças de cada um. Deus conhece-nos muito mais do que nós pensamos nos conhecer, sabe de quanto somos disponíveis a oferecer. Entretanto, ninguém pense que nasceu desprovido de dom, de talento que possa servir a Deus e ao próximo. Neste sentido, São João Crisóstomo nos afirma: “Esta parábola se apresenta contra aqueles que não só com dinheiro, nem com palavras, nem com qualquer outro modo querem ser úteis a seus próximos, mas, pelo contrário, não lhes servem” (Homiliae in Matthaeum, hom. 78,2). Todos possuímos algo para o oferecimento ao Reino e ao irmão, pois ninguém é tão pobre que não tenha nada a ofertar, já que o Senhor nos infunde os seus valorosos dons para que os desenvolvamos.
O patrão se ausenta. Sequer diz quando retornará para tomar posse do que lhe pertence e receber a devida prestação de contas, esperando que cada um tenha feito multiplicar aquilo que Lhe pertence, mas que foi dado para que outrem administre. Este homem é o nosso Redentor, que subiu ao céu. Aparentemente está distante, alheio às nossas obras, ao desenvolvimento dos talentos que Dele recebemos, mas esta viagem “para o estrangeiro” significa unicamente que Ele, doador dos talentos e dos dons provenientes de Sua bondade, nos deixa livres para administrá-los como quisermos, porém que esta liberdade não dispensa a responsabilidade e a justiça de, quando da sua volta, pedir satisfação do que lhe pertence e que havia-nos confiado.
Percebam ainda que, com seu o retorno, o homem, além de pedir contas do que é seu, ele não se escusa de tecer juízos de valores, ou seja, não deixa de realizar o seu julgamento. De imediato, vislumbramos que, além de dono dos talentos, ele também é juiz. Aos dois primeiros, que foram multiplicadores dos talentos do seu patrão, não economizando esforços, trabalhos, lutas, coragem para enfrentar as dificuldades no conseguimento do lucro, o homem, igualmente à competência dos seus servos, não economiza nos elogios e na recompensa: “Muito bem, servo bom e fiel! Como foste fiel na administração de tão pouco, eu te confiarei muito mais. Vem participar da minha alegria!” (Mt 25,21.23). Por terem sido conscientes da sua responsabilidade, por terem levado adiante e a bom termo o pouco desigual que lhes fora confiado, os dois empregados recebem do Divino Patrão e Juiz título igual ao de Moisés: ‘Homem de confiança para toda a minha casa’ (cf. Nm 12,7). Já quanto a recompensa, o patrão lhe confia, por incrível que pareça mais trabalho, uma responsabilidade maior e, mormente, mais sublime: a participação na alegria do seu senhor. Onde se dará esta alegria? No Céu. Lá gozaremos da alegria, da festa, da contínua presença do Senhor, o Divino Patrão e Justo Juiz. Neste sentido, a Oração de Coleta, dirigindo-se ao Senhor, reza: “[…] fazei que a nossa alegria consista em vos servir de todo o coração, pois só teremos felicidade completa, servindo a vós, o Criador de todas as coisas”.
Mas, vocês podem me questionar: E no céu existe maior e mais sublime trabalho do que aqui na terra? Sim, meus irmãos, lá há trabalho incansável e prazeroso. Como partícipes da alegria do Senhor, reinaremos com Ele; ser-nos-á, por exemplo, nos confiada a intercessão dos servos que ainda ficarão no campo, desenvolvendo os talentos do homem justo e exigente. Enquanto no céu estaremos unidos num labor mais eminente do reinado de Cristo, na terra, os bons empregados, entoarão, mediante o exemplo que tivermos deixado, os elogios a nós destinados, tal como a Primeira Leitura deste Domingo se encerra: “Proclamem o êxito de suas mãos, e na praça louvem as suas obras” (cf. Pr 31,31).
Debrucemo-nos agora sobre o terceiro servo. “Mas aquele que havia recebido um só, saiu, cavou um buraco na terra, e escondeu o dinheiro do seu patrão” (Mt 25,18). Na sua comodidade, infidelidade, covardia, preguiça, pensamento baixíssimo e irresponsabilidade, o terceiro homem, mesmo sabendo da severidade do seu senhor, prefere ocultar o que de precioso recebeu e que é conforme à sua capacidade, às suas forças. O terceiro homem é reflexo daqueles que apegam e se teimam ao que é terreno. Por isso, na parábola, o homem não esconde em outro lugar, mas num buraco, envolto em terra. Estes receberão um adjetivo e uma recompensa proporcionada às suas atitudes de inutilidade e desleixo, similares ao do terceiro empregado do Evangelho: “Servo mal e preguiçoso”, jogar-te-ei “lá fora, na escuridão”, onde “haverá choro e ranger de dentes”. Às fortíssimas dores de ser atirado, jogado fora, une-se a humilhação de ser condenado aos tormentos infernais.
O que estamos fazendo com os talentos que recebemos do Divino Patrão? Se o dia do Senhor, [que] virá como ladrão, nos advier hoje, estaremos dormindo, apegados à terra, desguarnecidos, como os outros, ou estaremos vigilantes e sóbrios para lhe retribuir com lucro o que Ele nos concedeu? Ouçamos o conselho de São Paulo na Segunda Leitura de hoje. Obriguemo-nos a empregar todos os bens que Deus nos concedeu fazendo a Sua vontade, na mesma consciência de que, com apenas um talento, podemos ser gloriosos, já que, no dia de nossa morte teremos de prestar estritas contas ao nosso Juiz, Jesus Cristo, a quem sejam dadas honras e glórias infindas.

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