(Ano B – 27 de novembro de 2011)
I Leitura: Is 63,
16b-17.19b; 64, 2b-7
Salmo Responsorial:
Sl 79 (80), 2ac e 3b.15-16.18-19 (R/. 4)
II Leitura: 1Cor 1,
3-9
Evangelho: Mc 13,
33-37 (Vigilância)
Queridos irmãos,
Entramos no tempo do Advento. Adventus, palavra latina que, com justeza, poderíamos traduzir como
“chegada”, “presença”, “vinda”. O Senhor está para chegar. A sua chegada insere
o mundo temporal (chronos) no tempo
de Deus (kairós = tempo de graça). Ao
assumir a nossa natureza, tomando um corpo na Encarnação, o Senhor dos tempos e
da eternidade se sujeita à nossa condição. No mundo antigo e pagão, o termo
Advento era uma palavra técnica que designava a chegada de um funcionário, ou
mesmo a visita de reis e imperadores aos seus domínios, ou ainda a chegada de
um deus que saía da sua divinal mansão oculta para manifestar o seu poder. A
Igreja-Esposa celebra o Advento. Cristianizamos todas essas práticas, pois o
“Esperado das nações” se coloca, em suas parábolas, não como um funcionário,
mas como patrão, como rei que dominará a terra. Ele que é Deus e veio
manifestar a sua onipotência através da sua misericórdia e do seu poder
salvador a toda humanidade.
Ao celebrarmos este tempo forte na espiritualidade litúrgica
da Igreja, constantemente diremos: “Veni,
Domine Iesu!” – Vem, Senhor Jesus! Assim, recordamos a primeira vinda do
Senhor, “revestido da nossa fragilidade […] para realizar seu eterno plano de
amor e abrir-nos o caminho da salvação” (Prefácio do Advento I), ao tempo em
que esperamos a sua volta, quando, “revestido de sua glória, ele virá uma
segunda vez para conceder-nos em plenitude os bens prometidos que hoje,
vigilantes, esperamos” (Ibidem).
Ainda neste tempo litúrgico, a Igreja, de uma forma especialíssima, vive dois
dos três “eixos” do tempo que cadenciam a história da salvação, a saber: no
início a criação, no centro a encarnação-redenção e no final a “parusia”, ou
seja, a vinda final que inclui também o juízo universal; portanto, a Igreja, no
tempo do Advento, se debruça mais demoradamente sobre estes dois últimos eixos:
encarnação e parusia.
Outra palavra que, a partir do Evangelho de hoje, de
sobremaneira nos norteará é “Vigiai!”. Ao se dirigir aos seus discípulos e
recomendar-lhes cautela e vigilância, Jesus se dirige a toda a sua Igreja.
Desde quando o Senhor ascendeu, a Igreja espera a sua volta gloriosa. Não sabe
quando será. Por isso, o espera fielmente, ao tempo em que implora: “Vinde, não
tardeis!”.
A Igreja é consciente de que ela é serva, não senhora,
embora seja Esposa que anseia fortemente pelo seu Amado. Jesus, ao contar esta
parábola que ouvimos no Evangelho, figura esta realidade. Ele é um homem
(logicamente, um patrão) que confia a sua casa à responsabilidade de
empregados, dando-lhes incumbências determinadas. Se ele é este patrão, nós,
Igreja, tanto hierarquia quanto laicato, somos esses empregados porque
participamos do Corpo Místico do Senhor, a Igreja. Cada um de nós temos a nossa
tarefa; a Igreja, Casa de Deus, possui inúmeros postos vagos.
“E mandou o porteiro
ficar vigiando” (Mc 13, 34). Quem é este porteiro senão o múnus profético da
Igreja nos seus pregadores? Assim como o porteiro deve estar atento aos mínimos
sinais em sua guarita, os pregadores devem estar atentos aos possíveis sinais
da vinda do Senhor.
O Senhor virá. Quando? "Quanto àquele dia e àquela
hora, ninguém o sabe, nem mesmo os anjos do céu, mas somente o Pai". (Mt
24,36). Por isso, estejamos na mais acurada atenção, para não nos encontrarmos
dormindo no maldito “relaxamento” do pecado. Por isso, este tempo de Advento é
um convite a um despertar contínuo. Se estivermos na madorna do pecado,
levantemo-nos! Despertemo-nos! Estas atitudes são sinais palpáveis de um assaz
vigilante. Daí, a Oração de Coleta suplicar: a Deus: “Ó Deus todo-poderoso, concedei
a vossos fiéis o ardente desejo de possuir o reino celeste, para que, acorrendo
com as nossas boas obras ao encontro de Cristo que vem, sejamos reunidos à sua
direita na comunidade dos justos”. As nossas obras identificam o nosso torpor
ou a nossa altiva vigilância.
Na Primeira Leitura, temos o profeta Isaías que coloca na
boca do povo um clamor ao Senhor, bem como um grito de esperança: Deus vai
salvar-nos! Ora, esta passagem do profeta se relaciona ao Exílio da Babilônia.
O povo de Israel estava escravo. Porém, antes mesmo de ser servil com o seu
corpo, Israel já o era interiormente, pelo pecado. Isaías escreve o exame de
consciência de Israel (cf. Is 64, 3 e 4). O povo espera pela libertação
integral que somente Deus pode dar, pois o rosto do Salvador de Israel é o de
um pai terno e misericordioso (cf. 63, 16b). Assim, como o Antigo Israel também
aconteceu conosco: éramos escravos do pecado; gemíamos sob o seu jugo;
estávamos mortos. Paternalmente, Deus se compadece de nós e, na Pessoa do
Filho, quebra as nossas algemas, não com manifestações violentas de seu poder,
mas com a ternura de uma criança, sujeito às limitações de criatura, porque
assim o quis. Não porque merecêssemos, mas vem ao nosso encontro por livre
iniciativa. Redimiu-nos, desmanchando as montanhas do pecado, derretendo-o
completamente. Calcou o opressor que nos oprimia. Tudo isso iniciou quando Deus
nos mostrou a sua face; rosto semelhante ao nosso, como nos alude o refrão do
Salmo Responsorial. Esse mostrar-se divino, representado pelo termo salmódico:
“Iluminai a vossa face sobre nós...” sinonímia também a máximka revelação da
misericórdia de Deus que se dá com todo o conjunto Encarnação – Páscoa de
Jesus, Filho do Pai.
Neste sentido, a liturgia nos apresenta, na Segunda Leitura,
São Paulo afirmando que, em Cristo, nós, que esperamos o retorno do Senhor,
fomos enriquecidos plenamente (cf. 1 Cor 1, 5), inclusive com a sabedoria de
Deus e com a perseverança na prática das boas obras como preparativo imediato
para a parusia.
Que a vivência do duplo Advento do Senhor (a espera
litúrgica do Filho de Deus Humanado e do Senhor da Glória que nos virá nos fins
dos tempos) nos auxilie, a fim de que, dispostos ao seu plano de amor,
estejamos atentos ao Cristo que nos vem em suas diversas formas, inclusive nos
irmãos.
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