segunda-feira, 20 de junho de 2011

QUINTA-FEIRA APÓS A SOLENIDADE DA SANTÍSSIMA TRINDADE: SOLENIDADE DO SANTÍSSIMO CORPO E SANGUE DE CRISTO





I Leitura: Dt 8, 2-3.14b-16 a

Salmo Responsorial Sl 147 (147B), 12-13.14-15.19-20 (R/. 12 a)

II Leitura: 1Cor 10, 16-17

Evangelho: Jo 6, 51-58





Ave Verum Corpus Natus da Maria Virgine!





Queridos irmãos,



Logo após a Solenidade da Santíssima Trindade – para sermos mais exatos, na quinta-feira seguinte –, a Igreja celebra uma segunda solenidade: a do Santíssimo Corpo e Sangue do Nosso Senhor Jesus Cristo. Assim, com uma pedagogia particular que lhe é própria, a Mãe Igreja nos convida a dirigir o olhar para a Hóstia Sagrada. Se, no domingo passado contemplávamos Deus em seu mistério trinitário, hoje o contemplamos no augustíssimo Sacramento da Eucaristia, sendo o mesmo Deus.

No Evangelho da Liturgia da Palavra de hoje, vemos Jesus se autodenominando Pão da Vida. Este discurso do Senhor que São João nos fornece é uma pregação que posteriormente nos remeterá para a Instituição da Eucaristia, ainda que este Autor Sagrado não a apresente em seu Evangelho (cf. Mt 26, 20-29; Mc 14, 17-25; Lc 22, 14-23; 1Cor 11, 23-25). Ora, esta realidade foi prefigurada desde muito no Antigo Testamento. Já com Abrão, vemos a figura de Melquisedec, que, de maneira misteriosa, sendo rei e sacerdote do Deus Altíssimo, traz para o nosso patriarca na fé, pão e vinho, dois alimentos ínfimos, e o abençoa (cf. Gn 14, 17-20). Que realidade desejaria aludir o autor do Gênesis, ao documentar tal fato sem precedentes e totalmente desfocado do restante do texto, se não for um sopro do Espírito que nos faz ver, diacronicamente, a figura do Verdadeiro Sacerdote (cf. Hb 7-8), do Verdadeiro Pão (cf. Jo  6, 51)?

Na Primeira Leitura, vemos outra prefiguração do Verdadeiro Alimento. Após ter dado ao Povo da Antiga Aliança, por meio de Moisés, a sua Lei, Deus recorda os seus benefícios para com Israel ao longo dos quarenta anos em que este estava errante pelo deserto. Lembra-lhes que, muito embora as dificuldades, o Senhor nunca havia relegado ao esquecimento o povo da primeira eleição. Todas estas benesses foram resumidas no fato de que Ele, em sua misericórdia, lhes alimentava com o maná, que proveniente do céu, era desconhecido pelos hebreus, e a partir destes, pelo restante da humanidade. Mas, o que era o maná? No começo era um nutrimento que enchia os olhos do povo de Israel, pois era dado pelo próprio Deus. Com o passar do tempo, fechados em seus duros corações, os hebreus começaram a sentir ojerizas por aquilo que lhes oferecera o Senhor. Nesta perícope de hoje, Deus revela qual a sua intenção ao dar-lhes o maná: “mostrar que nem só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca do Senhor” (Dt 8, 3). Pois bem, o maná prefigura o Verdadeiro Pão, o Autêntico Alimento proveniente do céu, Jesus Cristo. Se a intenção do Pai, ao dar o maná ao povo da antiga promessa, era manifestar que nem só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da sua boca (cf. Dt 8, 3), o que poderíamos pensar acerca de Jesus, Pão Verdadeiro? Ele, o Verbo Eterno do Pai, desceu dos céus, se fez um de nós, arrebanha em si os povos do mundo, fazendo-nos Povo da Nova e Irrevogável Aliança, alimenta-nos cotidianamente com o seu Corpo, inebria-nos com o seu Sangue, entregues de uma vez por todas no patíbulo da Cruz, coadunando em Si Palavra e Alimento celestes. Ele, o Verdadeiro Cordeiro Pascal, oferenda agradabilíssima ao Pai, prefigurado pelos sacrifícios judaicos, foi imolado uma vez por todas para nos libertar da escravidão do “Egito” do pecado, conduzindo-nos em meio aos desertos das agruras diárias que sofremos, visando o nosso bem futuro (cf. Dt 8, 16b), a Jerusalém do Alto (cf. Hb 12, 22). É ele o nosso viático.

Ao afirmar: “Ego sum Panis Vivus, qui de caelo descendi”, Jesus escandaliza não somente a alguns de seus seguidores, mas também nos nossos dias. A transubstanciação é um absurdo à nossa razão. Para esta, é inimaginável Deus se conter em espécies tão diminutas. Mais absurdo para os estultos é o poder de salvação que elas portam. Ao refletir acerca da realidade eucarística, São Josemaría Escrivá afirma, tecendo comentários sobre qual seria o maior ato de humildade de Jesus: “Humildade de Jesus: em Belém, em Nazaré, no Calvário... Porém, mais humilhação e mais aniquilamento na Hóstia Santíssima; mais que no estábulo, e que em Nazaré, e que na Cruz. Eucaristia é milagre do poder de Deus; da divindade que está velada nos acidentes de um frágil alimento e de uma licorosa bebida, mas que está totalmente ali, de maneira sacramental e verdadeira. Pela fé, nossos sentidos transcendem sem serem modificados. Nas espécies do pão e do vinho consagrados, experimentamos, desde já, aquilo que está reservado para nós no céu: a contemplação de Deus face a face, em um eterno festim: “Na Eucaristia, testamento de amor, ele se fez comida e bebida espirituais, que nos sustentam na caminhada para a Páscoa eterna” (cf. Prefácio da Santíssima Eucaristia III). Ainda que a linguagem seja deficiente na tentativa de tradução do Mistério, a Igreja, como Mestra, entoa solenemente a Sequência para enfatizar, ainda que sinteticamente, a proporção desta atitude de Jesus: fazer-se Alimento.

Já na Segunda Leitura, vemos a catequese de São Paulo aos coríntios sobre a unidade do Corpo Místico de Cristo, aludindo-a a igual unidade sacramental do Corpo e Sangue de Jesus. Se a cristandade participa, através da comunhão sacramental, da oferenda do Corpo e do Sangue do Senhor, atualizando o Sacrifício da Cruz de maneira incruenta, ela tem a suave obrigação de viver a unidade, tal como o próprio Jesus implorou ao Pai: “Ut unum sint” (Jo 17, 11). Este dever não é de cunho meramente sociológico, antes deve ser teológico: a Igreja não é agremiação, é comunhão! Somos a totalidade do Corpo Místico de Jesus, devemos ser um com Ele desde a nossa caminhada terrestre, sendo igualmente um com os irmãos, tornando-nos um só coração (cf. Prefácio da Santíssima Eucaristia II). Pois como afirma a Sequencia in Festo Sanctíssimi Corporis Christi:



Caro cibus, sanguis potus: manet tamen Christus totus sub utráque spécie. A suménte non concísus, non confráctus, non divísus: ínteger accípitur. Sumit unus, sumunt mille: quantum isti, tantum ille: nec sumptus consúmitur. Sumunt boni, sumunt mali: sorte tamen inaequáli, vitae vel intéritus” – Sua carne é comida, e seu sangue bebida, mas sob cada uma destas espécies está Cristo totalmente. Se o recebe integralmente, sem que nada possa dividi-lo, nem quebrá-lo, nem parti-lo. Recebe-o um, recebem-no mil, tanto estes como aquele, sem que nada possa consumi-lo. Recebem-no os bons, recebem-no os maus: no entanto com fruto desigual: para uns a vida, para outros, a morte.


É assim que, mergulhada nesta fé eucarística, colheremos continuamente os frutos da redenção, tal como pedimos ao Senhor Jesus na oração de coleta.

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