Queridos
irmãos,
Retornamos,
depois de certo tempo, às nossas pequenas ‘catequeses’ acerca do Ano da Fé. Nesta
ocasião, queremos tratar sobre o quarto artigo do nosso Credo: “Padeceu sob
Pôncio Pilatos. Foi crucificado, morto e sepultado”. O presente artigo de fé
foi bem comentado durante os últimos dias, na Semana Santa e no Sacro Tríduo
Pascal. No entanto, é salutar que nos debrucemos sobre a temática mais uma vez,
agora à lume do Ano proposto pela Igreja para o aprofundamento do crer a fé da
‘Esposa de Cristo’.
O
quarto artigo do Credo ensina-nos que Jesus Cristo, para remir o mundo com o seu
precioso Sangue, padeceu sob Pôncio Pilatos, governador da Judéia entre os anos
26-36 d.C., e, como sabemos, Jesus morreu no madeiro da Cruz, da qual foi
descido, e no fim sepultado. O termo ‘padeceu’ (em latim, passus, da mesma raiz etimológica da palavra paixão) tal como porta
o Símbolo dos Apóstolos e o Niceno-Constatinopolitano, exprime, com justeza,
todos os sofrimentos suportados por Jesus Cristo na sua Paixão. Mesmo sendo
verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem, Jesus Cristo padeceu enquanto
homem somente, porque enquanto Deus não podia padecer nem morrer, graças à
imortalidade de que só Deus goza.
O
Senhor foi crucificado. Mas que espécie de castigo era esse? Para quem servia?
O suplício da cruz era, naqueles tempos, o mais cruel e ignominioso de todos os
suplícios (cf. 1Cor 1,24). Mesmo reconhecendo a inocência de Jesus, Pilatos
ordena que o crucifiquem, cedendo, covardemente, às ameaças dos judeus. Logo,
foi um conchave entre as autoridades judaicas e o poder romano que ludibriaram
o povo. Jesus sofre a pena máxima porque afirmou ser ‘Filho de Deus’ – o que de
fato era. Acusado de blasfêmia, Jesus paga o mais alto preço: a perda da vida
com a máxima pena: ser crucificado!
“E,
sendo exteriormente reconhecido como homem, humilhou-se ainda mais, tornando-se
obediente até a morte, e morte de cruz” (Fl 2,8). Jesus bem que poderia ter-se
livrado das mãos dos judeus e de Pilatos (“O meu Reino não é deste mundo. Se o
meu Reino fosse deste mundo, os meus súditos certamente teriam pelejado para
que eu não fosse entregue aos judeus. Mas o meu Reino não é deste mundo” – Jo
18,36). Sim, Jesus Cristo podia livrar-se das mãos dos judeus ou de Pilatos;
mas, conhecendo que a vontade do seu Eterno Padre era que Ele padecesse e
morresse pela nossa salvação, submeteu-Se voluntária e obedientemente, e até
saiu ao encontro dos seus inimigos, e deixou-se espontaneamente prender e
conduzir à morte em uma cruz que encimou o Monte Calvário, ou Gólgota (em
hebraico, ‘Lugar da Caveira’).
Muitas
foram dádivas que nos advieram de Jesus na cruz: o exemplo de perdão e oração
pelos inimigos; deu por Mãe ao discípulo São João, e na pessoa dele a nós
todos, a sua mesma Mãe, Maria Santíssima; deu-nos os sacramentos, graças ao seu
peito aberto, de onde jorrou sangue e água; ofereceu a sua morte em sacrifício,
e satisfez à justiça de Deus pelos pecados dos homens. Mas, o maior de todos os
presentes foi o restabelecimento e a sublimação da nossa união com Deus pela
salvação do gênero humano em seu corpo estendido na cruz. Não bastaria que
viesse um Anjo satisfazer por nós, porque a ofensa feita a Deus pelo pecado
era, sob certo aspecto, infinita; e para satisfazê-la requeria-se uma Pessoa
que tivesse merecimento infinito, Jesus Cristo, homem, para poder padecer e
morrer, e Deus, para que os seus sofrimentos fossem de valor infinito. Por
isso, Santo Agostinho exclama: “O certe
necessarium Adæ peccátum, quod Christi morte delétum est! O felix culpa, quæ
talem ac tantum méruit habére Redemptorem!” – Ó pecado de Adão, de que
certamente se pode afirmar, que foi necessário; sendo ele extinto pela morte de
Cristo! Ó culpa feliz, que nos valeu semelhante e tão grande Redentor! – Este
mesmo canto é imortalizado no Exúltet,
proclamação da Páscoa na Mãe de todas as vigílias, a Vigília Pascal.
Ainda
relacionado ao tamanho dos méritos do Redentor para a nossa salvação,
ressaltamos que eles deveriam ser de valor infinito, porque a majestade de
Deus, ofendida pelo pecado, é infinita. No entanto, não era absolutamente
necessário que Jesus Cristo padecesse tanto, porque o menor dos seus
sofrimentos bastaria para a nossa redenção, pois cada um dos seus atos era de
valor infinito. Jesus quis sofrer tanto, para satisfazer mais abundantemente à
justiça divina, para nos mostrar mais claramente o seu amor, e para nos
inspirar maior horror ao pecado. Mesmo expirando no patíbulo da cruz, a
divindade não se separou nem do corpo nem da alma de Jesus Cristo; morreu como
todos os homens morrem: somente a alma se separou do seu corpo.
Acompanhados
das dádivas de Jesus estendido no ‘altar da cruz’, percebemos, graças aos
evangelhos, alguns prodígios na morte de Jesus, que revelam a magnanimidade de
sua extenuação: obscureceu-se o sol, tremeu a terra, abriram-se algumas
sepulturas, e muitos mortos ressuscitaram.
Jesus
Cristo morreu pela salvação de todos os homens, e satisfez por todos. Todavia,
nem todos se salvam, porque nem todos O reconhecem, nem todos seguem a sua lei,
nem todos se servem dos meios de santificação que nos deixou. Isso significa
dizer que, para nos salvarmos não basta que Jesus Cristo tenha morrido por nós,
mas é necessário que sejam aplicados, a cada um de nós, o fruto e os
merecimentos da sua Paixão e morte, aplicação que se faz, sobretudo, por meios
dos Sacramentos, instituídos para este fim pelo mesmo Jesus Cristo; e como
muitos ou não recebem os Sacramentos, ou não os recebem com as condições devidas,
eles tornam inútil para si próprios a morte de Jesus Cristo.
Queridos irmãos, bebamos da graça da
salvação haurida por Cristo inanimado na cruz. A sua morte, a morte da Vida
trouxe-nos vida na morte: aproveitemo-la enormemente! Que sempre exclamemos com
palavras e boas obras: “Bendita e louvada seja a paixão e morte de Jesus
Cristo, Nosso Senhor. Que quis padecer e morrer por nosso amor!”
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