terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Ó Emanuel

 "Ó Emanuel (Deus conosco), nosso Rei e Legislador, 
 esperança das nações e dos povos Salvador:
 vinde para salvar-nos, ó Senhor nosso Deus! (Is. 7, 14; 33, 22)"


                                                                                                              
                                                                                                                                                                                                                                                                                              * Por  Lucas Lagasse 

                Irmãos,
       Continuando as meditações sobre as antiquíssimas antífonas maiores, ou antífonas do "Ó", recordaremos, hoje, da última: Ó Emanuel.
Antes, cumpre dizer que são sete as antífonas, pois recordam "os sete dons do Espírito Santo de que o messias está repleto"[1]. Isso o vemos na descrição do Messias, encontrado em Isaías (11, 1-2): "Naquele dia, sairá um ramo do tronco de Jessé e um rebento brotará das suas raízes. Sobre ele repousará o Espírito do Senhor: espírito de sabedoria e de entendimento, espírito de conselho e de fortaleza, espírito de conhecimento e de temor do Senhor"; bem como na própria afirmação do Cristo (Lc 4, 18-19): "O Espírito do Senhor Deus está sobre Mim, porque o Senhor Me ungiu. Enviou-Me a anunciar a Boa-Nova aos que sofrem, para curar os desesperados, para anunciar a libertação aos exilados e a liberdade aos prisioneiros, para proclamar o ano da graça do Senhor".
                                       


    Emanuel, Deus conosco. Mas... para que o Verbo de Deus vem a nós? Por quais motivos Jesus Nosso Senhor está conosco? Quais as razões da Segunda Pessoa da Santíssima Trindade se fazer um de nós, e habitar em nosso meio (Jo 1, 14)?
Responde-nos o Catecismo da Igreja Católica (nos parágrafos 457 a 460):
1º) Para nos salvar, reconciliando-nos com Deus (1 Jo 4, 10; 4, 14; 3, 5);
2º) Para que assim conhecêssemos o amor de Deus (1 Jo 4, 9; Jo 3, 16);
3º) Para ser o nosso modelo de santidade (Mt 11, 29; Jo 14, 6; Mc 9, 7; Jo 15, 12);
4º) Para nos tornar "participantes da natureza divina" (2 Pe 1, 4).
         Todos esse motivos dariam tratados teológicos infindáveis. Atentemo-nos para o último, já que o termo Emanuel significa "Deus conosco", e assim somos lembrados da doutrina católica de que Cristo é uma única pessoa com duas naturezas distintas – verdadeiro Deus e verdadeiro homem – além de podermos meditar nessa relação entre Deus e o homem do ponto de vista escatológico (qual seja, o fim, a orientação, de nossa vida na fé).
       O mesmo Catecismo cita Santo Atanásio: "Porque o Filho de Deus fez-Se homem, para nos fazer deuses", e Santo Tomás: "O Filho Unigênito de Deus, querendo que fôssemos participantes da sua divindade, assumiu a nossa natureza para que, feito homem, fizesse os homens deuses", para esclarecer o 4º motivo, embasado no magistério de S. Pedro.
Esta troca (a Divindade tornando-se humana, e a humanidade divinizando-se) se nos parece estranha a primeira vista. Contudo, é doutrina, portanto, objeto material de nossa Fé, que essa troca de dons se deu na Encarnação, e se dá na nossa Redenção. Teólogos renomados esclarecem esse mistério, sem contudo exauri-lo, visto que nossa capacidade intelectual não abarcaria tamanha Graça, cabendo-nos aguardar a Visão Beatífica para cessar os mistérios, e vivermos tão somente a Caridade ( 1 Cor 13, 12-13). É o maior presente que podemos receber, é o Natal do Senhor, é também o nosso Natal, o nosso nascimento para a vida da Graça, para a vida divina. Corações ao alto!
       Reza a Santa Madre Igreja, em sua Liturgia, no tempo do Natal: "O admirabile commercium! Creator generis humani, animatum corpus sumens de Virgine nasci dignatus est; et, procedens homo sine semine, largitus est nobis suam deitatem". – "Oh admirável permuta! O Criador do gênero humano, tomando corpo e alma, dignou-Se nascer duma Virgem; e, feito homem sem progenitor humano, tornou-nos participantes da sua divindade!". Admirável "comércio", troca misericordiosa. Ele nos amou primeiro (1 Jo 4, 19).
Como lembrado acima, Nosso Senhor proclamou um ano da graça, como que eterno, sem fim, é o seu reinado - e por essa mesma misericórdia, vivemos um Ano Jubilar Extraordinário, conclamado pelo Santo Padre o Papa Francisco. Aproveitemos esse ano jubilar para aprofundar-nos na Misericórdia de Deus, que está conosco! Vivamos os tesouros, os presentes que Deus nos dá, ofereçamos a Ele nosso coração contrito e humilhado (Sl 50, 19) para que possa nele habitar e reinar!
      O Emanuel estando em nosso meio é aclamado como "Rei e Legislador, esperança das nações e dos povos Salvador".
Reza o Credo Niceno-constantinopolitano: "cuius regni non erit finis" - e o Seu reino não terá fim. Essa repetição da fala do Arcanjo S. Gabiel à Virgem Maria (Lc 1, 36) pelo Credo foi assumida, como nos diz o Santo Padre Emérito, Bento XVI, no século IV, quando todo Mediterrâneo abraçava  o Reinado de Nosso Senhor: "O reino do Filho de Davi, Jesus, se estende 'de mar a mar', de continente a continente, de um século ao outro".[2] Mas, lembremo-nos que Nosso Senhor mesmo nos disse "O meu reino não é daqui (deste mundo) (Jo 18, 36). O reinado sem fim de Jesus Cristo funda-se na fé e no amor, como lembra-nos Ratzinger. E não tem fim, pois o Rei mesmo é eterno, é Deus, Deus conosco, que nos faz participar de seu Reino, de Sua Glória. Glória essa que invade nosso mundo, na humildade virtuosa do Pequeno de Belém, num estábulo, e enche de paz a todos os homens de boa vontade (Lc 2, 12-14).
O Desejado dos povos veio a nós, e suplicamos a Ele: Salva-nos! Salva-nos dos nossos erros, vícios, e paixões. Salva-nos, Emanuel, do egoísmo, da falta de caridade, da tristeza, e do orgulho. Salva nossas nações, imersas no indiferentismo, no paganismo, e nas trevas. Dá-nos esperança, Emanuel, de um mundo novo; "renova a faça da terra" com o Seu Santo Natal!
Aqui encerramos as meditações, com a última antífona antecedente e subsequente ao Magnificat, na Liturgia das Vésperas desses dias precedentes ao Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Invocamos, pois, a bênção, a proteção, o auxílio e intercessão de Nossa Senhora do Ó, cujo ventre imaculado recebeu a visita d'Aquele que os céus não puderam conter, e afirmamos com o grande taumaturgo, Pe. Antônio Vieira:
"E se Jacó e Davi de tão longe reconheciam esta eternidade, como a não compreenderia o coração da Senhora dentro nos OO dos seus desejos, tanto mais intensos quantos mais vizinhos, e tanto mais dilatados quanto mais intensos? Um patriarca dizia: O Sapientia! Outro suspirava: O Adonay! Outro clamava: O Radix Jesse! Os demais: O Clavis David! O Oriens! O Rex Gentium! O Emmanuel! Mas nenhum disse, nem podia dizer: Ó Filho! E se os OO daqueles desejos faziam uns círculos tão dilatados, que eram eternos: — Desiderium collium aeternorum, et annos aeternos in mente habui[3] — que seriam os OO daquele coração e daquela Mãe, que o tinha concebido em suas entranhas e o havia de ver nascido em seus braços: Ecce concipies in utero, et panes Filium[4]."[5]
Ó Maria, Mãe do Amor, preparai meu coração para receber Nosso Senhor!
Feliz e Santo Natal!



[1] Cf. Novena do Santo Natal, da Administração Apostólica Pessoal S. João Maria Vianney, Ed. Dom Licínio, 2013, p. 16.
[2] RATZINGER, Joseph A. A infância de Jesus. São Paulo: Planeta, 2012,, p. 34.
[3] Desejo dos outeiros eternos (Gên. 49,26). — Tive na mente os anos eternos (Sl. 76, 6).
[4] Eis conceberás no teu ventre, e parirás um filho (Lc. 1,31).
[5] VIEIRA, Pe. Antônio. Sermões - Sermão de Nossa Senhora do Ó (1640). Erechim: Edelbra, 1998. Disponível em: <<http://www.literaturabrasileira.ufsc.br/documentos/?action=download&id=37356>>.

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