"Ó Emanuel
(Deus conosco), nosso Rei e Legislador,
esperança das nações e dos povos
Salvador:
vinde para salvar-nos, ó Senhor nosso Deus! (Is. 7, 14; 33, 22)"
* Por Lucas Lagasse
Irmãos,
Continuando as meditações sobre as antiquíssimas
antífonas maiores, ou antífonas do "Ó", recordaremos, hoje, da
última: Ó Emanuel.
Antes, cumpre dizer que são sete as antífonas,
pois recordam "os sete dons do Espírito Santo de que o messias está
repleto"[1].
Isso o vemos na descrição do Messias, encontrado em Isaías (11, 1-2): "Naquele
dia, sairá um ramo do tronco de Jessé e um rebento brotará das suas raízes.
Sobre ele repousará o Espírito do Senhor: espírito de sabedoria e de
entendimento, espírito de conselho e de fortaleza, espírito de conhecimento e
de temor do Senhor"; bem como na própria afirmação do Cristo (Lc 4,
18-19): "O Espírito do Senhor Deus está sobre Mim, porque o Senhor Me
ungiu. Enviou-Me a anunciar a Boa-Nova aos que sofrem, para curar os
desesperados, para anunciar a libertação aos exilados e a liberdade aos
prisioneiros, para proclamar o ano da graça do Senhor".
Emanuel, Deus conosco. Mas... para que o Verbo
de Deus vem a nós? Por quais motivos Jesus Nosso Senhor está conosco? Quais as
razões da Segunda Pessoa da Santíssima Trindade se fazer um de nós, e habitar
em nosso meio (Jo 1, 14)?
Responde-nos o Catecismo da Igreja Católica (nos
parágrafos 457 a 460):
1º) Para nos salvar, reconciliando-nos com Deus
(1 Jo 4, 10; 4, 14; 3, 5);
2º) Para que assim conhecêssemos o amor de Deus
(1 Jo 4, 9; Jo 3, 16);
3º) Para ser o nosso modelo de santidade (Mt 11,
29; Jo 14, 6; Mc 9, 7; Jo 15, 12);
4º) Para nos tornar "participantes da
natureza divina" (2 Pe 1, 4).
Todos esse motivos dariam tratados teológicos
infindáveis. Atentemo-nos para o último, já que o termo Emanuel significa
"Deus conosco", e assim somos lembrados da doutrina católica de que
Cristo é uma única pessoa com duas naturezas distintas – verdadeiro Deus e
verdadeiro homem – além de podermos meditar nessa relação entre Deus e o homem
do ponto de vista escatológico (qual seja, o fim, a orientação, de nossa vida
na fé).
O mesmo Catecismo cita Santo Atanásio:
"Porque o Filho de Deus fez-Se homem, para nos fazer deuses", e Santo
Tomás: "O Filho Unigênito de Deus, querendo que fôssemos participantes da
sua divindade, assumiu a nossa natureza para que, feito homem, fizesse os homens
deuses", para esclarecer o 4º motivo, embasado no magistério de S. Pedro.
Esta troca (a Divindade tornando-se humana, e a
humanidade divinizando-se) se nos parece estranha a primeira vista. Contudo, é
doutrina, portanto, objeto material de nossa Fé, que essa troca de dons se deu
na Encarnação, e se dá na nossa Redenção. Teólogos renomados esclarecem esse
mistério, sem contudo exauri-lo, visto que nossa capacidade intelectual não
abarcaria tamanha Graça, cabendo-nos aguardar a Visão Beatífica para cessar os
mistérios, e vivermos tão somente a Caridade ( 1 Cor 13, 12-13). É o maior
presente que podemos receber, é o Natal do Senhor, é também o nosso Natal, o
nosso nascimento para a vida da Graça, para a vida divina. Corações ao alto!
Reza a Santa Madre Igreja, em sua Liturgia, no
tempo do Natal: "O admirabile commercium! Creator generis humani,
animatum corpus sumens de Virgine nasci dignatus est; et, procedens homo sine
semine, largitus est nobis suam deitatem". – "Oh admirável
permuta! O Criador do gênero humano, tomando corpo e alma, dignou-Se nascer
duma Virgem; e, feito homem sem progenitor humano, tornou-nos participantes da
sua divindade!". Admirável "comércio", troca misericordiosa. Ele
nos amou primeiro (1 Jo 4, 19).
Como lembrado acima, Nosso Senhor proclamou um ano
da graça, como que eterno, sem fim, é o seu reinado - e por essa mesma
misericórdia, vivemos um Ano Jubilar Extraordinário, conclamado pelo Santo
Padre o Papa Francisco. Aproveitemos esse ano jubilar para aprofundar-nos na
Misericórdia de Deus, que está conosco! Vivamos os tesouros, os presentes que
Deus nos dá, ofereçamos a Ele nosso coração contrito e humilhado (Sl 50, 19)
para que possa nele habitar e reinar!
O Emanuel estando em nosso meio é aclamado como
"Rei e Legislador, esperança das nações e dos povos Salvador".
Reza o Credo Niceno-constantinopolitano: "cuius regni non erit finis" - e o Seu reino não terá fim. Essa repetição da fala do
Arcanjo S. Gabiel à Virgem Maria (Lc 1, 36) pelo Credo foi assumida, como nos
diz o Santo Padre Emérito, Bento XVI, no século IV, quando todo Mediterrâneo
abraçava o Reinado de Nosso Senhor:
"O reino do Filho de Davi, Jesus, se estende 'de mar a mar', de continente
a continente, de um século ao outro".[2]
Mas, lembremo-nos que Nosso Senhor mesmo nos disse "O meu reino não é
daqui (deste mundo) (Jo 18, 36). O reinado sem fim de Jesus Cristo funda-se na
fé e no amor, como lembra-nos Ratzinger. E não tem fim, pois o Rei mesmo é
eterno, é Deus, Deus conosco, que nos faz participar de seu Reino, de Sua
Glória. Glória essa que invade nosso mundo, na humildade virtuosa do Pequeno de
Belém, num estábulo, e enche de paz a todos os homens de boa vontade (Lc 2,
12-14).
O Desejado dos povos veio a nós, e
suplicamos a Ele: Salva-nos! Salva-nos dos nossos erros, vícios, e paixões.
Salva-nos, Emanuel, do egoísmo, da falta de caridade, da tristeza, e do
orgulho. Salva nossas nações, imersas no indiferentismo, no paganismo, e nas
trevas. Dá-nos esperança, Emanuel, de um mundo novo; "renova a faça da
terra" com o Seu Santo Natal!
Aqui encerramos as meditações, com a última
antífona antecedente e subsequente ao Magnificat, na Liturgia das Vésperas
desses dias precedentes ao Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Invocamos, pois, a bênção, a proteção, o auxílio
e intercessão de Nossa Senhora do Ó, cujo ventre imaculado recebeu a visita
d'Aquele que os céus não puderam conter, e afirmamos com o grande taumaturgo,
Pe. Antônio Vieira:
"E se Jacó e Davi de tão longe reconheciam esta eternidade, como a
não compreenderia o coração da Senhora dentro nos OO dos seus desejos, tanto
mais intensos quantos mais vizinhos, e tanto mais dilatados quanto mais
intensos? Um patriarca dizia: O Sapientia! Outro suspirava: O Adonay!
Outro clamava: O Radix Jesse! Os demais: O Clavis David! O
Oriens! O Rex Gentium! O Emmanuel! Mas nenhum disse, nem
podia dizer: Ó Filho! E se os OO daqueles desejos faziam uns círculos tão
dilatados, que eram eternos: — Desiderium collium aeternorum, et annos
aeternos in mente habui[3]
— que seriam os OO daquele coração e daquela Mãe, que o tinha concebido em suas
entranhas e o havia de ver nascido em seus braços: Ecce concipies in utero,
et panes Filium[4]."[5]
Ó Maria, Mãe do Amor, preparai meu coração para
receber Nosso Senhor!
Feliz e Santo Natal!
[1] Cf.
Novena do Santo Natal, da Administração Apostólica Pessoal S. João Maria
Vianney, Ed. Dom Licínio, 2013, p. 16.
[5] VIEIRA,
Pe. Antônio. Sermões - Sermão de Nossa Senhora do Ó (1640). Erechim: Edelbra,
1998. Disponível em: <<http://www.literaturabrasileira.ufsc.br/documentos/?action=download&id=37356>>.
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