terça-feira, 19 de março de 2013

ENSAIO ANTROPOLÓGICO A PARTIR DA MÚSICA CRISTÃ CONTEMPORÂNEA











Pelo Seminarista David Ângelo Oliveira Rocha*

Refletir sobre música cristã não é uma reflexão meramente abstrata, mas, concreta. Porque não é um problema baseado tão somente na arte (música), mas é uma reflexão antropológica. Se a música cristã anda mal é sinal que o homem, este ser pós-moderno está perdido em si mesmo, com o mundo e com Deus.

No decorrer da caminhada histórica da música cristã é possível perceber que há algum tempo (e mais agora) a música cristã está cada vez mais caindo em pé de igualdade à música profana. Um relativismo musical está cada vez mais forte na cabeça dos cristãos a tal ponto de introduzir músicas internacionais, MPB como fundo musical para matrimônios ou como músicas de entrada ou pós-comunhão.

Santo Agostinho já dizia que “a música, isto é, a doutrina e arte de bem modular, como anúncio de grandes coisas foi concedida pela divina liberalidade aos mortais dotados de alma racional” (Apud Papa Pio XII, Sacrae Disciplina). Aqui temos algo bastante interessante em relação aos termos utilizados pelo Santo Agostinho: doutrina e arte de bem modular. É assim que ele chama a música cristã, mas infelizmente é possível perceber na nossa pós-modernidade o esquecimento da própria doutrina católica dando lugar a letras puramente sentimentais feitas em primeira pessoa do singular: “Eu”. Uma música cristã sem doutrina cristã é uma música falseada, mascarada, ilusória. Sem doutrina nas letras, sem citar passagens bíblicas, mas ao contrário, narrando problemas pessoais o compositor cria suas obras buscando abranger a todos e ao mesmo tempo a ninguém.

Mas o que esperar de compositores que estão aderindo a cultura relativista e egoísta? Tanto faz utilizar o ritmo de forró em música endereçada ao momento de comunhão como criar músicas para adoração, mas, feitas com a intenção de narrar suas angústias ao invés de ser na primeira pessoa do plural ( Nós). Está cada vez mais urgente uma renovação na mentalidade dos músicos e dos ouvintes católicos, “o problema da renovação da música religiosa não é somente um problema artístico: implica o da renovação do homem, que é quem há de cantar” (BASURKO, 2005, p.17). Mas, como a música não surgiu primeiro e depois o homem, mas ao contrário, primeiro surgiu o homem e depois veio a música, é necessário uma renovação no homem (antropós), já que, a música é o exterior do que habita no interior do homem, é a manifestação daquilo que mexia com sua mente e coração. “O que sai do homem é o que contamina o homem” (Mc 7, 20), ou seja, o que sai do mais profundo do ser humano é o que destrói, atrapalha a si mesmo.

O motivo de estar utilizando aqui Música Cristã Contemporânea é proposital. Por conta dessa mistura (ou fusão) entre música sacra e música religiosa, seja ela música religiosa protestante ou não, com uma cadência melódica tendenciosa ao sentimentalismo, “sem querer”, acabamos colocando músicas dentro das nossas Igrejas Católicas mais direcionadas ao nosso eu (o eu do músico principal) do que ao tu (povo, assembleia) e o Tu (Deus). Logo, o egoísmo é externado pela música. É possível saber quando um músico é tocado pelo Evangelho ou é um profissional, porque este deve lembrar que a música é ali na Liturgia um meio que expressa e toca na mente e no coração do homem a nível totalitário e não apenas pessoal.

Sendo assim, percebemos aqui que a função da música cristã é tocar na consciência, no ser total do homem pós-moderno e fazer com que ele coloque a sua frente, sem máscaras, quem ele está sendo realmente. Como estou levando a minha vida? O que sou? Quem eu sou? É esta a vida que quero continuar até o meu último suspiro? Será que as nossas músicas católicas estão levando as pessoas à colocarem suas vidas em suas mãos e analisa-las a partir do Evangelho? Será que está tocando na consciência ao começar pelo próprio músico que executa? Ter a consciência do que está cantando, por que e para Quem está cantando? Se a música não levar a pessoa a refletir sobre sua vida, se não mexer na mente e no coração não acontecerá o mesmo que aconteceu com Santo Agostinho, foi a partir da música que o levou a chorar na entrada da Igreja e perceber que Deus existe. Só quando o homem for tocado pela música cristã madura ele sempre entoará “salmos, hinos e cantos inspirados, cantando e tocando de coração em honra do Senhor” (Efésios 5, 19). Deus manifesta-se também pelos acordes e pelas mãos dos homens: pelo simples músico.

* Seminarista da Arquidiocese de Aracaju. Aluno do IV Ano de Teologia do Seminário Maior Nossa Senhora da Conceição.

REFERÊNCIAS

SCHOKEL, Luís Alonso. Bíblia do Peregrino. 2ª edição. São Paulo: Paulus, 2006.

BASURKO, Xabier. O canto cristão na tradição primitiva. São Paulo: Paulus, 2005.

PIO XII, Papa. Carta Encíclica Musicae Sacrae Displina- Sobre a música sacra. 1955.
Acessar: Vaticano – Santa Sé Page: http://www.vatican.va

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