quarta-feira, 3 de junho de 2015

SOLENIDADE DO SANTÍSSIMO SACRAMENTO DO CORPO E SANGUE DE NOSSO SENHOR JESUS CRISTO

(Ano B - 04 de junho de 2015)

Por André Fernandes de Oliveira

Caríssimos irmãos,


Reunimo-nos nesta Quinta-Feira e, com a Santa Igreja Católica tributamos a perfeita doxologia ao Senhor que se encerra naqueles ínfimos acidentes do pão e do vinho consagrados. Pensamos, hoje, naquela antífona extraída do Livro da Sabedoria, dita de forma solene quando à Bênção do Santíssimo: Panem de caelo praestisti eis – Do céu lhes destes o Pão. De forma uníssona, respondemos: Omne delectamentum in se habentem, ou seja: “Que encerra em si toda doçura”. Palavras, de fato, capitais, tributadas ao Eterno que não mais bastasse tornar-se “condicionado” à nossa humanidade, rebaixou-se, outrossim, à forma de pão!
Na verdade, cristãos, numa só expressão sintetizar-se-ia a hodierna Solenidade: Mysterium fidei! Mistério da fé é o que adoramos e comungamos naqueles alimentos. Nosso assentimento credível à Sagrada Eucaristia a define: zikkàron. Anàmnnese. Memória, “presentificação” do Testamento da Caridade da Páscoa. Portanto, quando o sacerdote exclama, a Assembleia, professa: “Anunciamos Senhor, a vossa morte, e proclamamos a vossa Ressurreição. Vinde, Senhor Jesus!” Aqui, encontramos o ‘núcleo’ da Celebração da Santíssima Eucaristia! Impactamo-nos, por assim dizer, com ‘escandaloso’ fato. O quê ao altar ‘trouxemos’ como sinete da nossa oferta a Deus é aceito e o que Ele, através do Rito, ‘recebe’ e, neste, na sagrada ação litúrgica, devolve-nos singularmente: O Unigênito seu!
Questionemo-nos: Deus teria a real ‘necessidade’ de aceitar aos nossos dons?  Acerca, a própria Igreja, no Salmo de Resposta, pergunta-se: “Que poderei retribuir ao Senhor Deus por tudo aquilo que ele fez em meu favor?” (cf. Sl CXV, 12). Acaso, não somos nós os míseros Dele? Prova-se ambas interrogações, quando, à Oração Dominical, o Pai Nosso, dirigimos a petição: “O pão nosso de cada nos dai hoje”.  Cravados os nossos olhares à Mesa do Sacrifício, o Altar, assim o rogamos. Que compreensão, irmãos, extrairmos daí?  O pão e o vinho dados a Deus, são, naquela potência do Espírito, agora, a vera oblatio. Nossa participação em ‘entregar’ é, na verdade, a razão e o sublime sentimento de que somente Aquele, cujo vértice, é a Eternidade, poderia ‘permanecer’ no ato do Sacrifício Seu, já, de forma incruenta, no contexto da páscoa judaica!     
Nosso Santíssimo Salvador naquela ‘forma’ de banquete que é associada ao modo de manducar, beber... tornar-se ‘cúmplice’. Observemos, à guisa de exemplo, as atitudes de Pedro, João e a vilipendiosa traição do Iscariotes. Desta maneira, ladeados, uma vez imersos à vida na graça pelo Sacramento do Batismo, recebemos não somente à participação na Eucaristia os benefícios que Ela nos concede, mas, também, a séria ‘consequência’ no desdobrar da nossa terrenal peregrinação.
Pensando assim, também nos reportamos à cena dramática aos pés do Calvário que, comovente, narra São João naquele capítulo XIX, 15 : De pé, aos pés da cruz de Jesus, estavam a Sua Mãe, a irmã de sua mãe, Maria de Cléofas e perto dela o discípulo que ele amava. São João Crisóstomo, sobre, descreve: Quem estivesse no Calvário veria dois altares, onde se consumavam dois grandes sacrifícios: um era o Corpo de Jesus, o outro o Coração de Maria! 
Maravilhados com tamanha exposição do Boca de Ouro, a nossa participação na Eucaristia,   o que ousamos falar ‘comunhão’, deve ser qual a atitude de Maria Santíssima. Nossa vida no Altar do Senhor também se esparrama como que oblação e tão somente quando nos ‘identificamos’ com o Filho de Deus que Se Dá, por inteiro, à ‘Fração do Pão’, podemos pedir como aquela turba, quando Jesus falara sobre o ‘Pão da Vida’: “Dá-nos, Senhor, sempre desse pão!” (Jo VI).  A Eucaristia que como bem se referiu o Doutor Angélico, Santo Tomás de Aquino, sobre o qual todos os outros sacramentos estão ordenados, deve ser para o cristão o que Ela é para a Igreja: cume! 
Dado às considerações, detenhamo-nos, agora ao lecionário que a Liturgia nos reserva.  De forma coerente, as três leituras da Missa insiste à palavra aliança. A mesma também recebe outro nome que muitas vezes a Escritura Sagrada menciona: pacto. Na paulatina economia da salvação, Deus, revela-se e através da aliança estabelecia a presença com o seu povo. Mostrava-Se e a partir daí Israel deveria escolher, como diz a Escritura, ‘a vida’.  Recordemos a partir dos acontecimentos do Antigo Testamento: A criação, com os nossos primeiros pais; quando da vinda do dilúvio, pela queda, o Senhor Mostra-Se através da figura de um arco-íris a Noé; depois com Abraão ao lhe ordenar em deixar a Caldeia e partir e daí formar uma descendência segundo a fé.
Clarifica-nos assim que, na Revelação, o Onipotente ‘faz’ aliança com os seus. E, é nesta linha, que na plenitude dos tempos a Aliança não é executada com meros símbolos, e, até mesmo, uma expiação com sangue alheio, como bem alude o autor sagrado da Carta aos Hebreus: […] não com sangue de bodes e bezerros, mas com o seu próprio sangue   (cf. Hb IX, 15). Sangue é ‘vida’. À Escritura, ‘sangue’, é como se dissesse: empenhei-me de modo total e até ao fim. Por isto, logo o Sangue de Jesus, ‘derramado’ é o ‘penhor da nossa salvação’- garantia de que no Sacrifício da Nova e Eterna Aliança, a culpa herdada foi ‘redimida’ em Cristo e por Cristo no mistério de sua encarnação, paixão, morte e gloriosa ressurreição.  Este dogma é encerrado no sacramento do Corpo de Cristo! E, com razão, podemos nos encostar ao Profeta Jeremias: “Farei com eles uma aliança eterna!”
Por fim, ainda retomamos ao termo ‘’aliança’’ para compreendermos as palavras proclamadas pela Liturgia, no Evangelho. Diferente de São Lucas e São Mateus, São Marcos relata a Instituição da Santíssima Eucaristia inserindo-a num acontecimento, que, de per si, não se localiza como figura cronológica (o dia dos Ázimos, quando se imolava o cordeiro pascal) apenas, mas sim é um modo de ser entendido: as sombras antigas foram cessadas. Temos, no ‘hoje’, que é elemento para a ‘teologia da memória’, o que as figuras antigas anunciavam, conforme proclama solenemente a Sequência Lauda Sion, escrita por Santo Tomás de Aquino: Em tipos prefigurado, foi em Isaac imolado; no Cordeiro aos pais foi dado.  E, no deserto, em maná.  Com esta que é uma das últimas estrofes podemos pensar nos gestos de Jesus. Seus discípulos perguntam-No: “Onde queres que façamos os preparativos para comeres a Páscoa?”. Vão, obedientes, ao mandato do Senhor!
Aqui aquela páscoa como memória do êxodo do Egito, agora, já é inválida. Agora, a Páscoa, é Cristo todo no Pão e no Vinho tornados Eucaristia- Ação de Graças. Prova-se quando diz o Evangelho: Enquanto comiam, ou seja, à lembrança dos seus pais, do sacrifício do cordeiro pascal, do maná caído do céu, dou, “Eu”, a “minha carne como verdadeira comida e meu sangue como verdadeira bebida”! A Missa, irmãos, não ‘nasce’ na derradeira ceia, mas das palavras do Senhor que constituem a ‘fórmula’ daquele propiciatório Sacrifício: Tomai, isto é o meu corpo. (...) tomou o cálice (...) Isto é o meu sangue, o sangue da aliança, que é derramado em favor de muitos. (cf. Mc XIV, 22 sg.) Na sublimidade do Augusto Sacramento, nossos intentos se convergem, como aos versos do literata São José de Anchieta, em sua poesia,  “O Santíssimo Sacramento”:

Oh que pão, oh que comida,
Oh que divino manjar
Se nos dá no santo altar
Cada dia.
Filho da Virgem Maria
Que Deus Padre cá mandou
E por nós na cruz passou
Crua morte.
E para que nos conforte
Se deixou no Sacramento
Para dar-nos com aumento
Sua graça.
Esta divina fogaça
É manjar de lutadores,
Galardão de vencedores
Esforçados.
Deleite de enamorados
Que com o gosto deste pão
Deixem a deleite
transitória.
Quem quiser haver vitória
Do falso contentamento,
Goste deste sacramento
Divinal.

“Ave Verum Corpus natum de Maria Virgine”. Ao Senhor do Tempo e da Eternidade, o louvor e a imortalidade, graças, nessa vida pelo Sacramento tão excelso e na outra a gaudiosa eternidade. Amém!

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