(Ano B - 04 de junho de 2015)
Por André Fernandes de Oliveira
Caríssimos irmãos,
Reunimo-nos nesta Quinta-Feira e, com a
Santa Igreja Católica tributamos a perfeita doxologia ao Senhor que se encerra
naqueles ínfimos acidentes do pão e do vinho consagrados. Pensamos, hoje,
naquela antífona extraída do Livro da Sabedoria, dita de forma solene quando à
Bênção do Santíssimo: Panem de caelo
praestisti eis – Do céu lhes destes o Pão. De forma uníssona, respondemos: Omne delectamentum in se habentem, ou
seja: “Que encerra em si toda doçura”. Palavras, de fato, capitais, tributadas
ao Eterno que não mais bastasse tornar-se “condicionado” à nossa humanidade,
rebaixou-se, outrossim, à forma de pão!
Na verdade, cristãos, numa só expressão
sintetizar-se-ia a hodierna Solenidade: Mysterium
fidei! Mistério da fé é o que adoramos e comungamos naqueles alimentos.
Nosso assentimento credível à Sagrada Eucaristia a define: zikkàron. Anàmnnese. Memória, “presentificação” do Testamento da
Caridade da Páscoa. Portanto, quando o sacerdote exclama, a Assembleia,
professa: “Anunciamos Senhor, a vossa morte, e proclamamos a vossa
Ressurreição. Vinde, Senhor Jesus!” Aqui, encontramos o ‘núcleo’ da Celebração
da Santíssima Eucaristia! Impactamo-nos, por assim dizer, com ‘escandaloso’
fato. O quê ao altar ‘trouxemos’ como sinete da nossa oferta a Deus é aceito e
o que Ele, através do Rito, ‘recebe’ e, neste, na sagrada ação litúrgica, devolve-nos
singularmente: O Unigênito seu!
Questionemo-nos: Deus teria a real
‘necessidade’ de aceitar aos nossos dons? Acerca, a própria Igreja, no Salmo de
Resposta, pergunta-se: “Que poderei
retribuir ao Senhor Deus por tudo aquilo que ele fez em meu favor?” (cf. Sl
CXV, 12). Acaso, não somos nós os míseros Dele? Prova-se ambas interrogações,
quando, à Oração Dominical, o Pai Nosso, dirigimos a petição: “O pão nosso de
cada nos dai hoje”. Cravados os nossos
olhares à Mesa do Sacrifício, o Altar, assim o rogamos. Que compreensão,
irmãos, extrairmos daí? O pão e o vinho
dados a Deus, são, naquela potência do Espírito, agora, a vera oblatio. Nossa participação em ‘entregar’ é, na verdade, a
razão e o sublime sentimento de que somente Aquele, cujo vértice, é a
Eternidade, poderia ‘permanecer’ no ato do Sacrifício Seu, já, de forma incruenta, no contexto da páscoa
judaica!
Nosso Santíssimo Salvador naquela
‘forma’ de banquete que é associada ao modo de manducar, beber... tornar-se
‘cúmplice’. Observemos, à guisa de exemplo, as atitudes de Pedro, João e a
vilipendiosa traição do Iscariotes. Desta maneira, ladeados, uma vez imersos à
vida na graça pelo Sacramento do Batismo, recebemos não somente à participação
na Eucaristia os benefícios que Ela nos concede, mas, também, a séria
‘consequência’ no desdobrar da nossa terrenal peregrinação.
Pensando assim, também nos reportamos à
cena dramática aos pés do Calvário que, comovente, narra São João naquele
capítulo XIX, 15 : De pé, aos pés da cruz
de Jesus, estavam a Sua Mãe, a irmã de sua mãe, Maria de Cléofas e perto dela o
discípulo que ele amava. São João Crisóstomo, sobre, descreve: Quem estivesse no Calvário veria dois
altares, onde se consumavam dois grandes sacrifícios: um era o Corpo de Jesus,
o outro o Coração de Maria!
Maravilhados com tamanha exposição do
Boca de Ouro, a nossa participação na Eucaristia, o que ousamos falar ‘comunhão’, deve ser qual
a atitude de Maria Santíssima. Nossa vida no Altar do Senhor também se
esparrama como que oblação e tão somente quando nos ‘identificamos’ com o Filho
de Deus que Se Dá, por inteiro, à ‘Fração do Pão’, podemos pedir como aquela
turba, quando Jesus falara sobre o ‘Pão da Vida’: “Dá-nos, Senhor, sempre desse pão!” (Jo VI). A Eucaristia que como bem se referiu o Doutor
Angélico, Santo Tomás de Aquino, sobre o
qual todos os outros sacramentos estão ordenados, deve ser para o cristão o
que Ela é para a Igreja: cume!
Dado às considerações, detenhamo-nos,
agora ao lecionário que a Liturgia nos reserva.
De forma coerente, as três leituras da Missa insiste à palavra aliança. A mesma também recebe outro
nome que muitas vezes a Escritura Sagrada menciona: pacto. Na paulatina economia da salvação, Deus, revela-se e através
da aliança estabelecia a presença com o seu povo. Mostrava-Se e a partir daí
Israel deveria escolher, como diz a Escritura, ‘a vida’. Recordemos a partir dos acontecimentos do Antigo
Testamento: A criação, com os nossos primeiros pais; quando da vinda do
dilúvio, pela queda, o Senhor Mostra-Se através da figura de um arco-íris a
Noé; depois com Abraão ao lhe ordenar em deixar a Caldeia e partir e daí formar
uma descendência segundo a fé.
Clarifica-nos assim que, na Revelação, o
Onipotente ‘faz’ aliança com os seus. E, é nesta linha, que na plenitude dos
tempos a Aliança não é executada com meros símbolos, e, até mesmo, uma expiação
com sangue alheio, como bem alude o autor sagrado da Carta aos Hebreus: […] não com sangue de bodes e bezerros, mas com
o seu próprio sangue (cf. Hb IX, 15).
Sangue é ‘vida’. À Escritura, ‘sangue’, é como se dissesse: empenhei-me de modo
total e até ao fim. Por isto, logo o Sangue de Jesus, ‘derramado’ é o ‘penhor
da nossa salvação’- garantia de que no Sacrifício da Nova e Eterna Aliança, a
culpa herdada foi ‘redimida’ em Cristo e por Cristo no mistério de sua
encarnação, paixão, morte e gloriosa ressurreição. Este dogma é encerrado no sacramento do Corpo
de Cristo! E, com razão, podemos nos encostar ao Profeta Jeremias: “Farei com
eles uma aliança eterna!”
Por fim, ainda retomamos ao termo
‘’aliança’’ para compreendermos as palavras proclamadas pela Liturgia, no
Evangelho. Diferente de São Lucas e São Mateus, São Marcos relata a Instituição
da Santíssima Eucaristia inserindo-a num acontecimento, que, de per si, não se
localiza como figura cronológica (o dia dos Ázimos, quando se imolava o
cordeiro pascal) apenas, mas sim é um modo de ser entendido: as sombras antigas
foram cessadas. Temos, no ‘hoje’, que é elemento para a ‘teologia da memória’, o
que as figuras antigas anunciavam, conforme proclama solenemente a Sequência Lauda Sion, escrita por Santo Tomás de
Aquino: Em tipos prefigurado, foi em
Isaac imolado; no Cordeiro aos pais foi dado.
E, no deserto, em maná. Com
esta que é uma das últimas estrofes podemos pensar nos gestos de Jesus. Seus
discípulos perguntam-No: “Onde queres que façamos os preparativos para comeres
a Páscoa?”. Vão, obedientes, ao mandato do Senhor!
Aqui aquela
páscoa como memória do êxodo do Egito, agora, já é inválida. Agora, a Páscoa, é
Cristo todo no Pão e no Vinho tornados Eucaristia- Ação de Graças. Prova-se
quando diz o Evangelho: Enquanto comiam,
ou seja, à lembrança dos seus pais, do sacrifício do cordeiro pascal, do maná
caído do céu, dou, “Eu”, a “minha carne como verdadeira comida e meu sangue
como verdadeira bebida”! A Missa, irmãos, não ‘nasce’ na derradeira ceia, mas das
palavras do Senhor que constituem a ‘fórmula’ daquele propiciatório Sacrifício:
Tomai, isto é o meu corpo. (...) tomou o
cálice (...) Isto é o meu sangue, o sangue da aliança, que é derramado em favor
de muitos. (cf. Mc XIV, 22 sg.) Na sublimidade do Augusto Sacramento,
nossos intentos se convergem, como aos versos do literata São José de Anchieta,
em sua poesia, “O Santíssimo Sacramento”:
Oh que
pão, oh que comida,
Oh que divino manjar
Se nos dá no santo altar
Cada dia.
Oh que divino manjar
Se nos dá no santo altar
Cada dia.
Filho da
Virgem Maria
Que Deus Padre cá mandou
E por nós na cruz passou
Crua morte.
Que Deus Padre cá mandou
E por nós na cruz passou
Crua morte.
E para que
nos conforte
Se deixou no Sacramento
Para dar-nos com aumento
Sua graça.
Se deixou no Sacramento
Para dar-nos com aumento
Sua graça.
Esta
divina fogaça
É manjar de lutadores,
Galardão de vencedores
Esforçados.
É manjar de lutadores,
Galardão de vencedores
Esforçados.
Deleite de
enamorados
Que com o gosto deste pão
Deixem a deleite
transitória.
Que com o gosto deste pão
Deixem a deleite
transitória.
Quem quiser
haver vitória
Do falso contentamento,
Goste deste sacramento
Divinal.
Do falso contentamento,
Goste deste sacramento
Divinal.
“Ave Verum Corpus natum de Maria
Virgine”. Ao Senhor do Tempo e da Eternidade, o louvor e a
imortalidade, graças, nessa vida pelo Sacramento tão excelso e na outra a
gaudiosa eternidade. Amém!
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